sábado, 18 de março de 2017

Estudo do livro Nosso Lar


CLARÊNCIO

O estudo do capítulo 2 tem como informações gerais:
1)     Personagem: André Luiz, outros desencarnados, Clarêncio
2)     Resumo geral: Ainda refletindo sobre tudo o que o envolvia, André cansado clama humildemente auxílio do Pai Supremo e é socorrido pela equipe de Clarêncio.

CLARÊNCIO
"Suicida! Suicida! Criminoso! Infame!" - gritos assim, cercavam-me de todos os lados. Onde os sicários de coração empedernido? Por vezes, enxergava-os de relance, escorregadios na treva espessa e, quando meu desespero atingia o auge, atacava-os, mobilizando extremas energias. Em vão, porém, esmurrava o ar nos paroxismos da cólera. Gargalhadas sarcásticas feriam-me os ouvidos, enquanto os vultos negros desapareciam na sombra.”

Neste trecho, pode-se perceber até que ponto chega o ser espiritual entregue à loucura e/ou perda de consciência do seu real estado.
O livro dos Espíritos nas perguntas de 163 a 165 explicada:
“Perturbação Espiritual
163. A alma, ao deixar o corpo, tem imediatamente consciência de si mesma?
“Consciência imediata não é bem o termo; ela fica durante algum tempo em perturbação.”
164. Todos os Espíritos experimentam, no mesmo grau e com a mesma duração, a perturbação que se segue à separação da alma e do corpo?
“Não, isto depende da elevação deles. Aquele que já está purificado, se reconhece quase imediatamente, porque já se desligou da matéria durante a vida do corpo, enquanto que o homem carnal, aquele cuja consciência não está pura, conserva por muito mais tempo a impressão dessa matéria.”
165. O conhecimento do Espiritismo exerce uma influência sobre a duração, mais ou menos longa, da perturbação?
“Uma influência muito grande, visto que o Espírito compreendia, antecipadamente, a sua situação; porém, a prática do bem e a consciência pura são o que tem maior influência.”
No momento da morte, tudo, a princípio, é confuso; a alma necessita de algum tempo para se reconhecer; ela se encontra como que aturdida e no estado de alguém que sai de um sono profundo e procura tomar consciência de sua situação. A lucidez das ideias e a memória do passado lhe voltam, à medida que a influência da matéria, da qual acaba de se desligar, se apaga e que a espécie de névoa que obscurece os seus pensamentos se dissipa.
A duração da perturbação que se segue à morte é muito variável; pode ser de algumas horas, como de vários meses e, até, de vários anos. É menos longa naqueles que, enquanto vivos, identificaram-se com o seu estado futuro, porque, então, compreendem, imediatamente, sua posição.
Essa perturbação apresenta circunstâncias particulares, conforme o caráter dos indivíduos e, principalmente, segundo o gênero de morte. Nas mortes violentas, por suicídio, suplício, acidente, apoplexia, ferimentos, etc., o Espírito fica surpreso, espantado e não acredita estar morto; sustenta-o com obstinação; entretanto, vê o seu corpo, sabe que aquele corpo é o seu e não compreende que esteja separado dele; vai para junto das pessoas que estima, fala-lhes e não compreende por que elas não o ouvem. Esta ilusão perdura até o completo desligamento do perispírito; somente, então, o Espírito se reconhece e compreende que não faz mais parte dos vivos. Este fenômeno se explica facilmente. Surpreendido de improviso pela morte, o Espírito fica atordoado com a brusca mudança que nele se operou; para ele, a morte ainda é sinônimo de destruição, de aniquilamento; ora, como ele pensa, vê, ouve, no seu entender, não está morto; o que aumenta sua ilusão é que se vê com um corpo semelhante ao precedente, quanto à forma, porém, cuja natureza etérea ainda não teve tempo de examinar; julga-o sólido e compacto como o primeiro e, quando chamam sua atenção para esse ponto, espanta-se de não poder apalpá-lo. Este fenômeno é análogo ao dos sonâmbulos novatos que não creem dormir. Para eles, o sono é sinônimo de suspensão das faculdades; ora, como pensam livremente e veem, para eles, não dormem. Alguns Espíritos apresentam esta particularidade, embora a morte não lhes tenha ocorrido inopinadamente; ela, porém, é sempre mais comum naqueles que, embora doentes, não pensavam em morrer. Vê-se, então, o espetáculo singular de um Espírito que assiste ao próprio enterro, como se fosse o de um estranho e falando disso, como de algo que não lhe dissesse respeito, até o momento em que compreende a verdade.
A perturbação que se segue à morte nada tem de penosa para o homem de bem; conserva-se calmo e semelhante em tudo àquele que experimenta um despertar tranquilo. Para aquele cuja consciência não está pura, ela é cheia de ansiedade e de angústias, que aumentam, à medida que ele se reconhece.
Nos casos de morte coletiva, tem sido observado que todos aqueles que perecem ao mesmo tempo, nem sempre se reveem imediatamente. Na perturbação que se segue à morte, cada um vai para o seu lado, ou só se preocupa com aqueles que lhe interessam.”


Para quem apelar? Torturava-me a fome, a sede me escaldava. Comezinhos fenômenos da experiência material patenteavam-se-me aos olhos. Crescera-me a barba, a roupa começava a romper-se com os esforços da resistência, na região desconhecida. A circunstância mais dolorosa, no entanto, não é o terrível abandono a que me sentia votado, mas o assédio incessante de forças perversas que me assomavam nos caminhos ermos e obscuros. Irritavam-me, aniquilavam-me a possibilidade de concatenar ideias. Desejava ponderar maduramente a situação, esquadrinhar razões e estabelecer novas diretrizes ao pensamento, mas aquelas vozes, aqueles lamentos misturados de acusações nominais, desnorteavam-me irremediavelmente.”

Quantos, quando estão desencarnados e perdidos em seus pensamentos, conseguem ouvir a voz que vem de dentro? A voz clamante de socorro?
Este parágrafo remete aos episódios de tortura mental realizada pela maioria dos desencarnados, que esquecidos de si mesmos, não são capazes de aclamar a voz interior de auxílio. Muitos, dominados pelo orgulho e pelo egoísmo, preferem fugir a atender aos próprios apelos de amparo. Preferem se esconder e/ou ficar isolados – pelo menos, é o que imaginam estar -, do que deixar o coração aclamar a ajuda de acolhimento, de amor.
Em virtude disso, acabam perdendo tempos preciosos; acabam se descuidando, permitindo a influência de irmãos tão necessitados de amparo, carinho, amor que eles próprios.
De qualquer maneira, chega certo período em que o ser desencarnado começa perceber a necessidade de mudar de foco e de ir encontro de paz e tranquilidade, mesmo que em determinados momentos eles fiquem na balança entre ficar e seguir em frente.

- Que buscas, infeliz! Aonde vais, suicida?

Diante de determinados períodos, o ser desencarnado imagina estar só; contudo, isso não ocorre, visto que, uma vez que foi criado para viver em sociedade, jamais subsistirá fora afastado dela.
Na sentença acima e na anterior, André ouvi, não somente uma voz acusando-o de infeliz e de suicida, como se torna capaz de perceber a existência de diversas vozes tão infelizes quanto ele.

Tais objurgatórias, incessantemente repetidas, perturbavam-me o coração. Infeliz, sim; mas, suicida? - nunca! Essas increpações, a meu ver, não eram procedentes. Eu havia deixado o corpo físico a contragosto. Recordava meu porfiado duelo com a morte. Ainda julgava ouvir os últimos pareceres médicos, enunciados na Casa de Saúde; lembrava a assistência desvelada que tivera, os curativos dolorosos que experimentara nos dias longos que se seguiram à delicada operação dos intestinos. Sentia, no curso dessas reminiscências, o contato do termômetro, o pique desagradável da agulha de injeções e, por fim, a última cena que precedera o grande sono: minha esposa ainda jovem e os três filhos contemplando-me, no terror da eterna separação. Depois... o despertar na paisagem úmida e escura e a grande caminhada que parecia sem-fim.”

Neste parágrafo, André Luiz tem o discernimento da situação de desencarnado e de estar e ser infeliz; porém, não aceita a acusação de ser um “suicida”. Nessa situação cabe esclarecer o que se pode entender como um indivíduo suicida.
Todo ser criado por Deus recebe o presente divino da vida e esta não pode ser afetada seja pela própria criatura ou outra. No caso desta, o indivíduo praticante é denominado como homicida; e, no daquela, suicida.
O suicídio é o procedimento realizado pelo ser encarnado que não tendo coragem para encarar os próprios problemas realizados pelos mesmos, eliminam a vida pensando que acabando com ela, os problemas tão acabarão. O suicídio ocorre quando um ser encarnado elimina a vida confiada por Deus para o seu progresso espiritual.
Na introdução ao Estudo da Doutrina Espírita, item XV do livro dos Espíritos há a seguinte assertiva a respeito:

“Dentre as causas mais numerosas de sobre-excitação cerebral, é preciso incluir as decepções, os infortúnios, as afeições contrariadas, que são, ao mesmo tempo, as causas mais frequentes de suicídio. Ora, o verdadeiro espírita vê as coisas deste mundo de um ponto de vista bem elevado; elas lhe parecem tão pequenas, tão mesquinhas diante do futuro que o aguarda; a vida é para ele tão curta, tão fugidia, que as tribulações não são aos seus olhos senão os incidentes desagradáveis de uma viagem. O que, num outro, produziria uma violenta emoção, pouco o afeta; sabe, aliás, que as amarguras da vida são provas que servem para o seu adiantamento, se ele as suporta sem reclamar, porque será recompensado, conforme a coragem com que as tiver suportado. Suas convicções lhe dão, portanto, uma resignação que o preserva do desespero e, por conseguinte, de uma causa contínua de loucura e de suicídio. Ele sabe, além disso, através do espetáculo que lhe proporcionam as comunicações com os Espíritos, a sorte daqueles que, voluntariamente, abreviam seus dias, e o quadro é bem próprio a fazê-lo refletir; também é considerável o número daqueles que se detiveram à beira deste declive funesto. Aí está um dos resultados do Espiritismo. Que os incrédulos riam dele o quanto queiram; desejo-lhes as consolações que ele proporciona a todos aqueles que se deram ao trabalho de sondar-lhe as misteriosas profundezas.”

Por que a pecha de suicídio, quando fora compelido a abandonar a casa, a família e o doce convívio dos meus? O homem mais forte conhecerá limites à resistência emocional. Firme e resoluto a princípio, comecei por entregar-me a longos períodos de desânimo, e, longe de prosseguir na fortaleza moral, por ignorar o próprio fim, senti que as lágrimas longamente represadas visitavam-me com mais frequência, extravasando do coração.”

Neste período, o irmão entregue ao desânimo consegue deixar o orgulho de lado e se permite o sofrimento e o choro.
O livro dos Espíritos na pergunta 952 traz a seguinte alusão:
952. O homem que perece vítima do abuso de paixões que ele sabia que deveriam apressar o seu fim, mas às quais não tinha mais o poder de resistir, porque o hábito as transformara em verdadeiras necessidades físicas, comete um suicídio?
“É um suicídio moral. Não compreendeis que, neste caso, o homem é duplamente culpado? Há nele falta de coragem e bestialidade e, além disso, o esquecimento de Deus.”

É claro que, esta questão, não está se referindo aos sentimentos e a situação de André, visto que ele não consegue perceber-se como um suicida; contudo, a consciência começa a apontar a necessidade de amparo e a reclamar reflexões.
Por conseguinte, na segunda parte do Capítulo X no livro O Céu e o Inferno tem os seguintes esclarecimentos:

Em regra, o homem não tem o direito de dispor da vida, por isso que esta lhe foi dada visando deveres a cumprir na Terra, razão bastante para que não a abrevie voluntariamente, sob pretexto algum. Mas ao homem — visto que tem o seu livre-arbítrio — ninguém impede a infração dessa lei. Sujeita-se, porém, às suas consequências. O suicídio mais severamente punido é o resultante do desespero que visa à redenção das misérias terrenas, misérias que são ao mesmo tempo expiações e provações. Furtar-se a elas é recuar ante a tarefa aceita e, às vezes, ante a missão que se devera cumprir. O suicídio não consiste somente no ato voluntário que produz a morte instantânea, mas em tudo quanto se faça conscientemente para apressar a extinção das forças vitais.”

A quem recorrer? Por maior que fosse a cultura intelectual trazida do mundo, não poderia alterar, agora, a realidade da vida. Meus conhecimentos, ante o infinito, semelhavam-se a pequenas bolhas de sabão levadas ao vento impetuoso que transforma as paisagens. Eu era alguma coisa que o tufão da verdade carreava para muito longe. Entretanto, a situação não modificava a outra realidade do meu ser essencial. Perguntando a mim mesmo se não enlouquecera, encontrava a consciência vigilante, esclarecendo-me que continuava a ser eu mesmo, com o sentimento e a cultura colhidos na experiência material. Persistiam as necessidades fisiológicas, sem modificação. Castigava-me a fome todas as fibras, e, nada obstante, o abatimento progressivo não me fazia cair definitivamente em absoluta exaustão. De quando em quando, deparavam-se-me verduras que me pareciam agrestes, em torno de humildes filetes d’água a que me atirava sequioso. Devorava as folhas desconhecidas, colava os lábios à nascente turva, enquanto mo permitiam as forças irresistíveis, a impelirem-me para a frente. Muita vez suguei a lama da estrada, recordei o antigo pão de cada dia, vertendo copioso pranto. Não raro, era imprescindível ocultar-me das enormes manadas de seres animalescos, que passavam em bando, quais feras insaciáveis. Eram quadros de estarrecer! acentuava-se o desalento. Foi quando comecei a recordar que deveria existir um Autor da Vida, fosse onde fosse. Essa ideia confortou-me. Eu, que detestara as religiões no mundo, experimentava agora a necessidade de conforto místico. Médico extremamente arraigado ao negativismo da minha geração, impunha-se-me atitude renovadora. Tornava-se imprescindível confessar a falência do amor próprio, a que me consagrara orgulhoso.

Neste parágrafo, o irmão sofre, todavia começa a nascer à vontade de pedir socorro e a depreender a existência de algo maior do que ele: “Autor da Vida”.
O capítulo III do livro dos Espíritos traz a seguinte informação a:

“Perturbação Espiritual
163. A alma, ao deixar o corpo, tem imediatamente consciência de si mesma?
“Consciência imediata não é bem o termo; ela fica durante algum tempo em perturbação.”

164. Todos os Espíritos experimentam, no mesmo grau e com a mesma duração, a perturbação que se segue à separação da alma e do corpo?
“Não, isto depende da elevação deles. Aquele que já está purificado, se reconhece quase imediatamente, porque já se desligou da matéria durante a vida do corpo, enquanto que o homem carnal, aquele cuja consciência não está pura, conserva por muito mais tempo a impressão dessa matéria.”

165. O conhecimento do Espiritismo exerce uma influência sobre a duração, mais ou menos longa, da perturbação?
“Uma influência muito grande, visto que o Espírito compreendia, antecipadamente, a sua situação; porém, a prática do bem e a consciência pura são o que tem maior influência.”
No momento da morte, tudo, a princípio, é confuso; a alma necessita de algum tempo para se reconhecer; ela se encontra como que aturdida e no estado de alguém que sai de um sono profundo e procura tomar consciência de sua situação. A lucidez das ideias e a memória do passado lhe voltam, à medida que a influência da matéria, da qual acaba de se desligar, se apaga e que a espécie de névoa que obscurece os seus pensamentos se dissipa.
A duração da perturbação que se segue à morte é muito variável; pode ser de algumas horas, como de vários meses e, até, de vários anos. É menos longa naqueles que, enquanto vivos, identificaram-se com o seu estado futuro, porque, então, compreendem, imediatamente, sua posição.
Essa perturbação apresenta circunstâncias particulares, conforme o caráter dos indivíduos e, principalmente, segundo o gênero de morte. Nas mortes violentas, por suicídio, suplício, acidente, apoplexia, ferimentos, etc., o Espírito fica surpreso, espantado e não acredita estar morto; sustenta-o com obstinação; entretanto, vê o seu corpo, sabe que aquele corpo é o seu e não compreende que esteja separado dele; vai para junto das pessoas que estima, fala-lhes e não compreende por que elas não o ouvem. Esta ilusão perdura até o completo desligamento do perispírito; somente, então, o Espírito se reconhece e compreende que não faz mais parte dos vivos. Este fenômeno se explica facilmente. Surpreendido de improviso pela morte, o Espírito fica atordoado com a brusca mudança que nele se operou; para ele, a morte ainda é sinônimo de destruição, de aniquilamento; ora, como ele pensa, vê, ouve, no seu entender, não está morto; o que aumenta sua ilusão é que se vê com um corpo semelhante ao precedente, quanto à forma, porém, cuja natureza etérea ainda não teve tempo de examinar; julga-o sólido e compacto como o primeiro e, quando chamam sua atenção para esse ponto, espanta-se de não poder apalpá-lo. Este fenômeno é análogo ao dos sonâmbulos novatos que não creem dormir. Para eles, o sono é sinônimo de suspensão das faculdades; ora, como pensam livremente e veem, para eles, não dormem. Alguns Espíritos apresentam esta particularidade, embora a morte não lhes tenha ocorrido inopinadamente; ela, porém, é sempre mais comum naqueles que, embora doentes, não pensavam em morrer. Vê-se, então, o espetáculo singular de um Espírito que assiste ao próprio enterro, como se fosse o de um estranho e falando disso, como de algo que não lhe dissesse respeito, até o momento em que compreende a verdade.
A perturbação que se segue à morte nada tem de penosa para o homem de bem; conserva-se calmo e semelhante em tudo àquele que experimenta um despertar tranquilo.
Para aquele cuja consciência não está pura, ela é cheia de ansiedade e de angústias, que aumentam, à medida que ele se reconhece.
Nos casos de morte coletiva, tem sido observado que todos aqueles que perecem ao mesmo tempo, nem sempre se reveem imediatamente. Na perturbação que se segue à morte, cada um vai para o seu lado, ou só se preocupa com aqueles que lhe interessam.”

E, quando as energias me faltaram de todo, quando me senti absolutamente colado ao lodo da Terra, sem forças para reerguer-me, pedi ao Supremo Autor da Natureza me estendesse mãos paternais, em tão amargurosa emergência.”

Enfim, em determinado momento, cansado de tanto sofrer, todo e qualquer desencarnado consegue perceber que a única porta de “salvação” para o seu sofrimento, é pedir amparo do Alto.
Isso se realiza através da prece.
O evangelho segundo o Espiritismo XXVII – Pedi e obtereis esclarece:

“Ação da prece.
Transmissão do pensamento
9. A prece é uma invocação; por seu intermédio entramos em comunicação, pelo pensamento, com o ser a quem nos dirigimos. A prece pode ter por finalidade um pedido, um agradecimento ou uma glorificação. Podemos pedir por nós mesmos ou pelos outros, pelos vivos ou pelos mortos. As que são endereçadas a Deus são ouvidas pelos espíritos encarregados da execução da sua vontade; as que são dirigidas aos bons espíritos são igualmente levadas a Deus. Quando oramos para outros seres, que não a Deus, eles são apenas intermediários, intercessores, porquanto nada pode ser feito sem a vontade divina.
10. O Espiritismo nos faz compreender a ação da prece, explicando como se processa a transmissão do pensamento, seja quando o ser chamado atende ao nosso apelo, seja quando o nosso pensamento chega até ele. Para se compreender o que se passa nessa circunstância, é preciso imaginar todos os seres, encarnados e desencarnados, imersos no fluido universal que ocupa o espaço, assim como aqui na Terra estamos mergulhados na atmosfera. O fluido recebe o impulso da vontade, ele é o veículo do pensamento, como o ar é o veículo do som, com a diferença de que as vibrações do ar são circunscritas, enquanto que as do fluido universal se estendem ao infinito. Assim sendo, quando o pensamento é dirigido para um ser qualquer, sobre a Terra ou no espaço, de encarnado a desencarnado ou de desencarnado a encarnado, uma corrente fluídica se estabelece de um ao outro, transmitindo o pensamento, da mesma forma que o ar transmite o som.
A energia dessa corrente está na razão direta da energia do pensamento e da vontade. É assim que a prece é ouvida pelos espíritos, em qualquer lugar em que eles se encontrem; que os espíritos se comunicam entre si; que nos transmitem suas inspirações e que se estabelecem as relações, à distância, entre os encarnados.
Essa explicação visa a esclarecer principalmente aqueles que não compreendem a utilidade da prece puramente mística; não tem por finalidade materializar a prece, mas tornar os seus efeitos compreensíveis, mostrando que ela pode ter uma ação direta e efetiva, mas que não está menos subordinada à vontade de Deus, juiz supremo em todas as coisas e o único que pode tornar sua ação eficaz.
11. Pela prece, o homem atrai para si o concurso dos bons espíritos, que vêm sustentá-lo nas suas boas resoluções e inspirar-lhe bons pensamentos. Dessa forma, ele adquire a força moral necessária para vencer as dificuldades e retornar ao caminho certo, se dele tiver se afastado, desviando, assim, os males que atrairia para si por suas próprias faltas.
Um homem, por exemplo, vê sua saúde arruinada pelos excessos que cometeu, e, até o fim da sua vida, arrasta uma existência de sofrimentos. Tem ele o direito de se lastimar por não obter sua cura? Não, porque poderia ter encontrado na prece as forças para resistir às tentações.
12. Se dividirmos os males da vida em duas partes, uma com os males que o homem não pode evitar, e a outra com as atribulações das quais ele mesmo é a primeira causa, pela sua falta de cuidado e seus excessos (Ver cap. V, item 4), veremos que a segunda parte é muito mais numerosa que a primeira. É bem evidente, portanto, que o homem é o autor da maior parte das suas aflições, e que muito se pouparia, se agisse sempre com prudência e sabedoria. Não é menos certo que essas misérias são o resultado do nosso desrespeito às leis de Deus, e que, se as observássemos rigorosamente, seríamos inteiramente felizes. Se não ultrapassássemos o limite do indispensável, na satisfação das nossas necessidades, não teríamos as doenças que são a consequência dos excessos, nem passaríamos pelas vicissitudes que essas doenças acarretam. Se puséssemos limites às nossas ambições, não precisaríamos nos preocupar com a ruína; se fôssemos humildes, não sofreríamos com as decepções do orgulho ferido; se praticássemos a lei da caridade, não seríamos maledicentes, nem invejosos, nem ciumentos, e evitaríamos as querelas e as dissensões; se não fizéssemos mal a ninguém, não teríamos que temer as vinganças, etc.
Admitamos, porém, que o homem nada possa fazer sobre os outros males; que toda prece seja inútil para se preservar deles; já não seria muito, ele poder livrar-se daqueles que resultam dos seus próprios atos? Ora, aqui a ação da prece se concebe facilmente, porque ela tem por efeito buscar a inspiração salutar dos bons espíritos, pedir-lhes forças para resistir aos maus pensamentos, cuja concretização pode nos ser funesta. Nesse caso, não é o mal que eles afastam, é a nós mesmos que eles afastam do pensamento que pode causar o mal; os bons espíritos em nada impedem os decretos de Deus, eles não suspendem o curso das leis da Natureza, é a nós que eles impedem de infringir essas leis, dirigindo o nosso livre-arbítrio. Mas eles o fazem sem que o percebamos, de maneira oculta, para não subjugar a nossa vontade.
O homem se encontra, então, na posição daquele que solicita bons conselhos e os pratica, mas que sempre é livre de segui-los ou não. Deus quer que seja assim, para que o homem tenha a responsabilidade dos seus atos e para lhe deixar o mérito da escolha entre o bem e o mal. É isso que o homem deve estar sempre certo de obter, se pedir com fervor, e é principalmente nesse caso que se podem aplicar estas palavras: .Pedi e obtereis..
A eficácia da prece, mesmo reduzida a essas proporções, já não seria um imenso resultado? Estava reservado ao Espiritismo provar a ação da prece pela revelação das relações que existem entre o mundo corporal e o mundo espiritual. Mas os seus efeitos não se limitam unicamente a isso. A prece é recomendada por todos os espíritos; renunciar à prece é desconhecer a bondade de Deus; é rejeitar a assistência que ela proporciona a si mesmo, e o bem que pode fazer aos outros.
13. Atendendo ao pedido que lhe é dirigido, Deus muitas vezes tem em vista recompensar a intenção, o devotamento e a fé daquele que ora; eis por que a prece do homem de bem tem mais mérito, aos olhos de Deus, e sempre mais eficácia, porque o homem mau e cheio de vícios não pode orar com o fervor e a confiança que só o sentimento da verdadeira piedade pode oferecer. Do coração do egoísta, daquele que ora apenas com os lábios, só podem sair palavras, nunca os impulsos da caridade, que dão à prece todo o seu poder. Compreende-se isso de tal forma que, instintivamente, nós nos recomendamos às preces daqueles cuja conduta nos parece ser agradável a Deus, pois serão melhor ouvidas.
14. Como a prece exerce uma espécie de ação magnética, poderíamos supor que o seu efeito está subordinado ao poder fluídico, porém, não é assim. Já que os espíritos exercem essa ação sobre os homens, eles suprem a insuficiência daquele que ora, quando isso é necessário, quer agindo diretamente em seu nome, quer dando-lhe momentaneamente uma força excepcional, desde que ele seja julgado digno dessa graça ou que ela possa ser útil.
O homem que não se considera bom o bastante para exercer uma influência salutar, não deve deixar de orar por outra pessoa, pensando que não é digno de ser escutado. O reconhecimento da sua inferioridade é uma prova de humildade sempre agradável a Deus, que leva em conta a intenção caridosa que o anima. Seu fervor e sua confiança em Deus são um primeiro passo para o seu retorno ao bem, para o qual os bons espíritos sentem-se felizes em encorajá-lo. A prece que não é aceita é a do orgulhoso que tem fé em seu poder e em seus méritos, e acredita ser capaz de substituir a vontade do Eterno.
15. O poder da prece está no pensamento; não provém das palavras, nem do lugar, nem do momento em que é feita. Pode-se, portanto, orar em qualquer lugar, a qualquer hora, a sós ou junto com outras pessoas. A influência do lugar ou do tempo tem uma relação de dependência com as circunstâncias que podem favorecer o recolhimento. A prece em comum tem uma ação mais poderosa, quando todos aqueles que oram se unem, de coração, a um mesmo pensamento e têm um mesmo objetivo, porquanto é como se muitos clamassem juntos, ao mesmo tempo; porém, de que adianta estarem reunidos em grande número se cada um age isoladamente e por sua própria conta? Cem pessoas reunidas podem orar como egoístas, enquanto que duas ou três, unidas por um ideal comum, estarão orando como verdadeiros irmãos em Deus, e sua prece terá mais poder do que a daquelas cem pessoas. (Ver cap. XXVIII, itens 4 e 5.)

Quanto tempo durou a rogativa? Quantas horas consagrei à súplica, de mãos-postas, imitando a criança aflita? Apenas sei que a chuva das lágrimas me lavou o rosto; que todos os meus sentimentos se concentraram na prece dolorosa. Estaria, então, completamente esquecido? Não era, igualmente, filho de Deus, embora não cogitasse de conhecer-lhe a atividade sublime quando engolfado nas vaidades da experiência humana? Por que não me perdoaria o Eterno Pai, quando providenciava ninho às aves inconscientes e protegia, bondoso, a flor tenra dos campos agrestes?”

A maioria das pessoas pensa que só pelo fato de estar em prece rogando auxílio, será ajudado.
É certo que tudo que pedires ao Alto, o indivíduo será atendido; todavia, esse pedido precisa ser realizado de coração aberto, sincero, puro.
O capítulo XXVII Pedi e obtereis do Evangelho segundo o Espiritismo elucida:

“Eficácia da prece
5. .Seja o que for que peçais na prece, crede que o obtereis, e vos será concedido.. (Marcos, XI: 24.)
6. Há pessoas que contestam a eficácia da prece, baseando-se no princípio de que, sendo Deus conhecedor de todas as nossas necessidades, é inútil expô-las a Ele. Acrescentam ainda que nossas súplicas não podem mudar os desígnios de Deus, porquanto tudo no Universo se encadeia por leis eternas.
Há leis naturais e imutáveis que, sem dúvida alguma, Deus não pode anular segundo o capricho de cada um, mas daí a crer que todas as circunstâncias da vida estão submetidas à fatalidade, a distância é muito grande. Se assim fosse, o homem seria apenas um instrumento passivo, sem livre-arbítrio e sem iniciativa. Nessa hipótese, só lhe restaria curvar a cabeça sob a ação dos acontecimentos, sem procurar evitá-los, e não deveria procurar esquivar-se dos perigos. Deus não lhe deu a razão e a inteligência para que não se servisse delas, a vontade para não querer, a atividade para ficar inativo. Sendo o homem livre para agir em todos os sentidos, seus atos têm, para si e para os outros, conseqüências subordinadas ao que ele fez ou deixou de fazer. Por conseguinte, por sua iniciativa, há acontecimentos que, forçosamente, escapam à fatalidade, e que não destroem a harmonia das leis universais, da mesma forma que o avanço ou o atraso dos ponteiros de um relógio não destrói a lei do movimento, sobre a qual está estabelecido o seu mecanismo. Deus pode, portanto, concordar com certos pedidos, sem anular a imutabilidade das leis que regem o conjunto, ficando o atendimento desses pedidos sempre subordinado à sua vontade.
7. Seria ilógico concluir por estas palavras: .Seja o que for que peçais pela prece, vos será concedido., que é suficiente pedir para obter, assim como seria injusto acusar a Providência se ela não atende a todo pedido que lhe é feito, porquanto ela sabe melhor do que nós o que é para o nosso bem. É assim que procede um pai sensato, que recusa ao seu filho as coisas que seriam contrárias ao seu interesse. O homem, geralmente, vê apenas o presente; ora, se o sofrimento é útil à sua felicidade futura, Deus deixará que ele sofra, como o cirurgião deixa o doente sofrer com uma operação que vai lhe proporcionar a cura.
O que Deus lhe concederá, se ele o pedir com confiança, é a coragem, a paciência e a resignação. E o que ainda lhe concederá são os meios de sair das dificuldades, com a ajuda das idéias que Ele fará os bons espíritos lhe sugerirem, de maneira que o mérito da ação ficará para o homem. Deus assiste os que se ajudam a si mesmos, de acordo com estas palavras: .Ajuda-te, e o céu te ajudará., e não aqueles que esperam tudo de um socorro alheio, sem fazer uso de suas próprias faculdades. Na maioria das vezes, porém, o homem prefere ser socorrido por um milagre, sem fazer o menor esforço. (Ver cap. XXV, item 1 e seguintes.)
8. Vejamos este exemplo: um homem está perdido em um deserto; sofre horrivelmente com a sede; sente-se desfalecer e deixa-se cair sobre a areia. Roga a Deus que o assista, e espera; porém, nenhum anjo vem lhe dar de beber. No entanto, um bom espírito lhe sugere a idéia de se levantar, de seguir em uma determinada direção dentro da amplidão diante dele. Então, por um movimento instintivo, reunindo suas forças, levanta-se e caminha ao acaso. Chegando a uma elevação, descobre ao longe um regato; e, com essa visão, recupera a coragem. Se ele tem fé, exclamará: .Obrigado, meu Deus, pela idéia que me haveis inspirado e pela força que me destes.. Se não tem fé, dirá: .Que boa idéia eu tive! Que sorte, tomar a direção da direita e não a da esquerda; o acaso, realmente, algumas vezes nos ajuda! Quanto eu me felicito pela minha coragem e por não me haver deixado vencer pelo abatimento..
No entanto, poder-se-á perguntar, por que o bom espírito não lhe disse claramente .segue esta direção, e encontrar ás o de que precisas. ou por que não se mostrou a ele para guiá-lo e sustentá-lo no seu desfalecimento. Dessa maneira, certamente, o teria convencido da intervenção da Providência. A resposta é simples; inicialmente, seria para ensinar que ele deveria ajudar a si mesmo, fazendo uso das próprias forças. Depois, pela incerteza, Deus põe à prova a confiança e a submissão à sua vontade. Aquele homem estava na situação de uma criança que cai, e que, vendo alguém, começa a gritar, esperando que venham levantá-la; se não vê ninguém, esforça-se e levanta-se sozinho.
Se o anjo que acompanhou Tobias lhe houvesse dito: “Eu sou enviado por Deus para te guiar na tua viagem e te preservar de todo perigo., Tobias não teria tido nenhum mérito porque, confiando em seu companheiro, não sentiria necessidade nem de pensar. Eis por que o anjo só se deu a conhecer quando regressavam.”

As perguntas 658 e 659 do Livro dos Espíritos informa:
A Prece
658. A prece é agradável a Deus?
“A prece é sempre agradável a Deus, quando ditada pelo coração, pois a intenção é tudo para ele; a prece feita de coração é preferível àquela que podes ler, por mais bela que seja, se a lês mais com os lábios do que com o pensamento.
A prece é agradável a Deus, quando dita com fé, fervor e sinceridade; mas não creias que ele seja tocado pela do homem vão, orgulhoso e egoísta, a menos que represente, de sua parte, um ato de sincero arrependimento e de verdadeira humildade.”

659. Qual o caráter geral da prece?
“A prece é um ato de adoração. Orar a Deus é pensar nele; é aproximar-se dele; é colocar-se em comunicação com ele. Através da prece, podemos propor-nos a três coisas: louvar, pedir, agradecer.”

No livro Céu e Inferno, há as seguintes palavras “[...] O que o Espiritismo afirma é que o valor da prece está no pensamento, e não nas palavras, que as melhores preces são as do coração, e não dos lábios, e [....]
E, no livro A Gênese, Kardec escreve no capítulo II - Deus: “Para estender a sua solicitude a todas as criaturas, não precisa Deus lançar o olhar do Alto da imensidade. As nossas preces, para que Ele as ouça, não precisam transpor o espaço, nem ser ditas com voz retumbante, pois que, estando sempre ao nosso lado, os nossos pensamentos repercutem nele. Os nossos pensamentos são como os sons de um sino, que fazem vibrar todas as moléculas do ar ambiente.”

Ah! é preciso haver sofrido muito, para entender todas as misteriosas belezas da oração; é necessário haver conhecido o remorso, a humilhação, a extrema desventura, para tomar com eficácia o sublime elixir de esperança. Foi nesse instante que as neblinas espessas se dissiparam e alguém surgiu, emissário dos Céus. Um velhinho simpático me sorriu paternalmente. Inclinou--se, fixou nos meus os grandes olhos lúcidos, e falou:

E por mais que não se acredite, não há mal que perdure infinitamente. Mais dias, menos dia, o auxílio do Alto sempre chega.
No capítulo XXVII, pode-se encontrar a seguinte pérola de conforto:

Aventura da prece
23. Vinde, todos vós que desejais crer; os espíritos celestes auxiliam e vêm vos anunciar grandes acontecimentos. Deus, meus filhos, abre os seus tesouros para vos dar todos os seus benefícios. Homens incrédulos! Se soubésseis quanto bem a fé traz ao coração e como leva a alma ao arrependimento e à prece! Ah! a prece! Como são comoventes as palavras que saem da boca no momento em que se ora!
A prece é o orvalho divino que faz desaparecer o grande calor das paixões; filha mais velha da fé, ela nos leva pelo caminho que conduz a Deus. No recolhimento e na solidão, estais com Deus; e para vós não há mistérios, porque eles se desvendam. Apóstolos do pensamento, para vós é a verdadeira vida; vossa alma se desliga da matéria e se lança nesses mundos infinitos e etéreos que os pobres humanos desconhecem.
Caminhai, caminhai pelos caminhos da prece, e escutareis as vozes dos anjos. Que harmonia! Não mais o ruído confuso nem os cantos estridentes da Terra; são as liras dos arcanjos; são as vozes doces e suaves dos serafins, mais leves que a brisa da manhã, quando brincam na folhagem dos vossos grandes bosques. Em que delícias havereis de caminhar! Vossas palavras não poderão definir essa ventura, que entrará por todos os povos, tão viva e refrescante é a fonte em que se bebe quando se está orando. Doces vozes, inebriantes perfumes que a alma ouve e sente quando se lança nessas esferas desconhecidas, habitadas pela prece. Sem a mistura dos desejos carnais, todas as aspirações são divinas. [...]”


”- Coragem, meu filho! O Senhor não te desampara.”

Não há melhor bálsamo para os ouvidos do que ouvir estas palavras de conforto e achego quando se está sofrendo.
Na mensagem do Bem e Mal sofrer há a seguinte assertiva: “

O homem não tem recompensas por essa espécie de coragem, mas Deus lhe reserva os louros da vitória e um lugar glorioso. Quando vos chegar um motivo de dor ou de contrariedade, esforçai-vos para superá-lo, e quando chegardes a dominar os impulsos da impaciência, da cólera ou do desespero, dizei com uma justa satisfação: “Eu fui o mais forte...”
.Bem-aventurados os aflitos. pode, portanto, ser assim traduzido: Bem-aventurados aqueles que têm o ensejo de provar sua fé, sua  firmeza, sua perseverança e sua submissão à vontade de Deus, pois eles terão centuplicadas a alegria que lhes falta na Terra, e, após o trabalho, virá o repouso.”


Amargurado pranto banhava-me a alma toda. Emocionado, quis traduzir meu júbilo, comentar a consolação que me chegava, mas, reunindo todas as forças que me restavam, pude apenas inquirir:

Neste parágrafo, André Luiz começa a receber auxílio divino e convém refletir: Quem é que nunca sentiu uma sensação de alívio ou o coração relaxar após a tempestade? É uma emoção ímpar: de conforto, de esperança, de fé... Não há palavra pronunciada capaz de exprimir a real comoção sentida no momento. É uma felicidade que não se consegue comprar, não se consegue medir, não se consegue ...
O capítulo V do Evangelho segundo o Espiritismo traz a seguinte mensagem de conforto:

A felicidade não é deste mundo
20. Eu não sou feliz! A felicidade não foi feita para mim! Lamenta-se geralmente o homem, em todas as posições sociais. Isso prova, meus queridos filhos, melhor que todos os raciocínios possíveis, a verdade desta afirmativa do Eclesiastes: (66) .A felicidade não é deste mundo.. Realmente, nem a fortuna, nem o poder, nem mesmo a juventude em flor são as condições essenciais da felicidade; e digo mais: nem mesmo a reunião dessas três condições tão desejadas, porquanto ouvimos frequentemente, no meio das classes mais privilegiadas, pessoas de todas as idades lamentarem amargamente a sua condição de vida.
Diante de tal resultado, é inconcebível que as classes laboriosas e participantes desejem, com tanta cobiça, a posição daqueles que a fortuna parece haver favorecido. Aqui na Terra, por mais que se faça, cada um tem a sua parte de trabalho e de miséria, sua cota de sofrimentos e de decepções. De onde é fácil chegar à conclusão de que a Terra é um lugar de provas e de expiações.
Assim, pois, aqueles que pregam que a Terra é a única morada do homem, e que somente nela, e em apenas uma existência, lhe é permitido atingir o mais alto grau de felicidade que a sua natureza comporta, iludem-se, e enganam os que os escutam, visto que está demonstrado, por uma experiência arqui-secular, que a Terra só excepcionalmente contém as condições necessárias à felicidade completa do indivíduo.
Em tese geral, pode-se afirmar que a felicidade é uma utopia, em busca da qual as gerações se lançam, sucessivamente, sem poderem jamais alcançá-la, visto que, se o homem sábio é uma raridade aqui na Terra, o homem totalmente feliz não é encontrado com facilidade.
A felicidade na Terra consiste em algo tão efêmero para aquele que não é guiado pela sabedoria que, por um ano, um mês, uma semana de completa satisfação, todo o resto da existência se passa numa série de amarguras e de decepções, e notai, meus queridos filhos, que falo aqui dos felizes da Terra, daqueles que são invejados pelas multidões.
Consequentemente, se a morada terrestre está sujeita às provas e às expiações é forçoso admitir que existem, em outra parte, moradas mais favorecidas onde o espírito do homem, ainda aprisionado em um corpo material, possui, em sua plenitude, as alegrias ligadas à vida humana. Eis por que Deus semeou no infinito esses belos planetas superiores para onde vossos esforços e vossas tendências um dia vos farão gravitar, quando estiverdes suficientemente purificados e aperfeiçoados.
Contudo, não se deduza das minhas palavras que a Terra esteja destinada a servir, para sempre, de penitenciária; certamente que não! Dos progressos adquiridos podeis facilmente imaginar os progressos futuros, e das melhorias sociais conquistadas, novas e mais fecundas melhorias. Essa é a tarefa imensa que deve ser realizada pela nova doutrina que os espíritos revelaram.
Assim, pois, meus queridos filhos, que um santo estímulo vos anime, e que cada um dentre vós se despoje energicamente do homem velho. Todos deveis vos dedicar à divulgação do Espiritismo, que já começou a nossa própria regeneração. É um dever fazer vossos irmãos participarem dos raios da sagrada luz, portanto, mãos à obra, meus queridos filhos! Que nesta reunião solene todos os vossos corações aspirem pelo objetivo grandioso de preparar, para as futuras gerações, um mundo onde a felicidade não será mais uma palavra sem valor. (François-Nicolas-Madeleine, cardeal Morlot.(67) Paris, 1863.)”


- Quem sois, generoso emissário de Deus?
O inesperado benfeitor sorriu bondoso e respondeu:
- Chama-me Clarêncio, sou apenas teu irmão.”

Neste diálogo, André consegue receber amparo do irmão chamado por Clarêncio. Isso prova que quando se desnuda o espírito, tornando-se humilde e aberto o coração, a assistência não tarda, vem ao encontro dos aflitos.
A pergunta 87 do Livro dos Espíritos alude:
“87. Os Espíritos ocupam uma região determinada e circunscrita no espaço?
“Os Espíritos estão por toda a parte; povoam os espaços sem fim, até o infinito. Estão, constantemente, ao vosso lado, vos observam e atuam sobre vós, sem que o percebais, pois os Espíritos são uma das potências da Natureza e os instrumentos de que Deus se serve para o cumprimento de seus desígnios providenciais. Porém, nem todos vão a toda parte, porquanto há regiões interditadas aos menos adiantados.”


E, percebendo o meu esgotamento, acrescentou:
- Agora, permanece calmo e silencioso. É preciso descansar para reaver energias.”

Depois da tempestade vem a bonança.
Nestas sentenças, Clarêncio acalenta André Luiz para o descanso, já que suas energias estão esgotadas.
Todo ser espiritual possui certa quantidade de energia. O livro Gênese esclarece:
“31. Como se há visto, o fluido universal é o elemento primitivo do corpo carnal e do perispírito, os quais são simples transformações dele. Pela identidade da sua natureza, esse fluido, condensado no perispírito, pode fornecer princípios reparadores ao corpo; o Espírito, encarnado ou desencarnado, é o agente propulsor que infiltra num corpo deteriorado uma parte da substância do seu envoltório fluídico. A cura se opera mediante a substituição de uma molécula malsã por uma molécula sã. O poder curativo estará, pois, na razão direta da pureza da substância inoculada; mas, depende também da energia da vontade que, quanto maior for, tanto mais abundante emissão fluídica provocará e tanto maior força de penetração dará ao fluido. Depende ainda das intenções daquele que deseje realizar a cura, seja homem ou Espírito. Os fluidos que emanam de uma fonte impura são quais substâncias medicamentosas alteradas.”
As perguntas de 68 a 70 do Livro dos Espíritos aclara:

A Vida e a Morte
68. Qual é a causa da morte nos seres orgânicos?
“Esgotamento dos órgãos.”
a) Poder-se-ia comparar a morte à cessação do movimento numa máquina desorganizada?
“Sim, se a máquina está desajustada, cessa a atividade; se o corpo está enfermo, a vida se extingue.”
69. Por que uma lesão do coração causa mais a morte do que a de outros órgãos?
“O coração é uma máquina de vida; mas o coração não é o único órgão cuja lesão ocasiona a morte; ele é apenas uma das peças essenciais.”
70. O que se tornam a matéria e o princípio vital dos seres orgânicos, quando da morte destes?
“A matéria inerte se decompõe e forma outros; o princípio vital retorna à massa.”
Estando morto o ser orgânico, os elementos dos quais é formado sofrem novas combinações, que constituem novos seres; estes haurem na fonte universal o princípio da vida e da atividade, absorvem-no e o assimilam, para devolvê-lo a essa fonte, quando deixarem de existir.
Os órgãos são impregnados, por assim dizer, de fluido vital. Esse fluido dá a todas as partes do organismo uma atividade que possibilita seu inter-relacionamento e, em certas lesões, restabelece funções, momentaneamente suspensas. Porém, quando os elementos essenciais ao funcionamento dos órgãos estão destruídos, ou muito profundamente alterados, o fluido vital é impotente para lhes transmitir o movimento da vida e o ser morre.
Os órgãos reagem, mais ou menos necessariamente, uns sobre os outros; é da harmonia de seu conjunto que resulta sua ação recíproca. Quando uma causa qualquer destrói esta harmonia, suas funções cessam, como o movimento de um mecanismo cujas peças essenciais estão escangalhadas. Assim como um relógio que com o tempo se gasta ou se quebra por acidente e cuja força motriz é impotente para colocar em movimento.
Num aparelho elétrico, temos uma imagem mais exata da vida e da morte. Este aparelho, como todos os corpos da Natureza, contém a eletricidade em estado latente. Os fenômenos elétricos apenas se manifestam, quando o fluido é colocado em atividade por uma causa especial: então, poder-se-ia dizer que o aparelho está vivo. Vindo a cessar a causa da atividade, o fenômeno cessa: o aparelho retorna ao estado de inércia. Os corpos orgânicos seriam, assim, espécies de pilhas ou aparelhos elétricos nos quais a atividade do fluido produz o fenômeno da vida: a cessação dessa atividade produz a morte.
A quantidade de fluido vital não é absoluta em todos os seres orgânicos; ela varia segundo as espécies e não é constante, nem no mesmo indivíduo, nem nos indivíduos da mesma espécie. Há aqueles que estão, por assim dizer, saturados dele, enquanto que outros possuem-no apenas numa quantidade sufi ciente; daí, para alguns a vida mais ativa, mais tenaz, e de certa forma, superabundante.
A quantidade de fluido vital se esgota; ela pode se tornar insuficiente para a manutenção da vida, se não for renovada pela absorção e a assimilação das substâncias que o contêm.
O fluido vital se transmite de um indivíduo a um outro indivíduo. Aquele que o possui em maior quantidade, pode dá-lo àquele que possui menos, e em certos casos, reacender a vida prestes a extinguir-se.


Em seguida, chamou dois companheiros que guardavam atitude de servos desvelados e ordenou:
- Prestemos ao nosso amigo os socorros de emergência.
Alvo lençol foi estendido ali mesmo, à guisa de maca improvisada, aprestando-se ambos os cooperadores a transportarem-me, generosamente.”

O que refletir sobre estes três parágrafos, se não a confirmação do recebimento e cuidado que todo ser espiritual recebe do plano espiritual.
Quantos encarnados pensam só existir vida se está na carne? E quando se deparam com cenas como estas ficam surpresos com o que veem?
Agora, cabe aqui uma reflexão: o Plano Espiritual é a cópia da Terra? Ou a Terra é a cópia do Plano Espiritual?
Para aqueles que já têm conhecimento do mundo espiritual conseguirá perceber que o Planeta Terra é uma cópia deturpada do espiritual; entretanto, vale refletir a respeito do tempo que se perde com situações que não se levará a lugar algum.

Quando me alçavam, cuidadosos, Clarêncio meditou um instante e esclareceu, como quem recorda inadiável obrigação:
- Vamos sem demora. Preciso atingir "Nosso Lar" com a presteza possível.”

Nosso Lar? O que será isso? Esse lugar?
Nestas sentenças finais do capítulo II, cabe refletir a respeito da pergunta 181 do livro dos Espíritos:

“181. Os seres que habitam os diferentes mundos têm corpos semelhantes aos nossos?
“Certamente, têm corpos, porque é necessário que o Espírito esteja revestido de matéria para agir sobre a matéria; esse envoltório, porém, é mais ou menos material, conforme o grau de pureza a que os Espíritos tenham chegado e é o que faz a diferença entre os mundos que devemos percorrer; pois há várias moradas na casa de nosso Pai, sendo estas, então, de vários graus. Uns sabem e têm consciência disso, na Terra; com outros, não se dá, absolutamente, o mesmo.”

E no Evangelho de João:
“1. .Que o vosso coração não se perturbe. Crede em Deus, crede também em mim. Há muitas moradas na casa de meu Pai; se assim não fosse, eu já vos teria dito, porquanto eu vou para preparar o lugar para vós; e depois que eu tiver ido, e preparado o lugar, voltarei, e vos retirarei para mim, a fim de que, lá onde estou, vós estejais também.. (João, XIV:1 a 3.)”

Leitura Complementar

Desgosto da Vida. Suicídio
943. De onde provém o desgosto da vida que se apodera de alguns indivíduos, sem motivos plausíveis?
“Efeito da ociosidade, da falta de fé e, frequentemente, da saciedade. Para aquele que exerce suas faculdades com um fim útil e de acordo com suas aptidões naturais, o trabalho nada tem de árido e a vida passa mais rapidamente; suporta-lhe as vicissitudes com tanto mais paciência e resignação, porquanto age tendo em vista a felicidade mais sólida e mais durável que o espera.”

944. O homem tem o direito de dispor de sua própria vida?
“Não, só Deus tem este direito. O suicídio voluntário é uma transgressão desta lei.”

a) O suicídio não é sempre voluntário?
 “O louco que se mata não sabe o que faz.”

945. O que pensar do suicídio que tem como causa o desgosto da vida?
“Insensatos! Por que não trabalhavam? A existência não lhes teria sido tão pesada!”

946. O que pensar do suicídio que tem como objetivo escapar das misérias e das decepções deste mundo?
“Pobres Espíritos, que não têm a coragem de suportar as misérias da existência! Deus ajuda aqueles que sofrem e, não, aqueles que não possuem força nem coragem. As tribulações da vida são provas ou expiações; felizes os que as suportam sem murmurar, pois serão recompensados por isso! Infelizes, ao contrário, aqueles que esperam sua salvação daquilo que, na sua impiedade, chamam de acaso ou fortuna! O acaso ou a fortuna, para me servir da linguagem deles, podem, com efeito, favorecê-los por um instante, mas é para lhes fazer sentir, mais tarde e mais cruelmente, o nada que representam essas palavras.”

a) Aqueles que tenham conduzido o infeliz a esse ato de desespero sofrerão as consequências disso?
“Oh! Esses, pobres deles, pois responderão por isso, como por um assassinato.”

947. O homem que luta contra a necessidade e que se deixa morrer de desespero pode ser considerado como um suicida?
“É um suicídio, mas aqueles que o causaram, ou que poderiam impedi-lo, são mais culpados do que ele e a indulgência o espera. Entretanto, não creiais que ele seja inteiramente absolvido, se lhe faltaram firmeza e perseverança e se não usou de toda a sua inteligência, para sair do atoleiro. Pobre dele, principalmente, se seu desespero nasce do orgulho; quero dizer, se ele for desses homens em quem o orgulho paralisa os recursos da inteligência, que corariam de dever sua existência ao trabalho de suas mãos e que preferem morrer de fome a descer daquilo que chamam de sua posição social! Não haverá cem vezes mais grandeza e dignidade em lutar contra a adversidade, em afrontar a crítica de um mundo fútil e egoísta, que só tem boa-vontade para com aqueles a quem nada falta e que vos vira as costas, assim que precisais dele? Sacrificar sua vida à consideração desse mundo é uma coisa estúpida, pois ele nenhuma importância dá a isso.”

948. O suicídio que tem por objetivo escapar da vergonha de uma ação má é tão reprovável quanto aquele que é causado pelo desespero?
“O suicídio não apaga a falta; ao contrário, em vez de uma, haverá duas.
Quando se teve a coragem de fazer o mal, é preciso ter a de sofrer-lhe as consequências. Deus julga e, conforme a causa, pode, algumas vezes, diminuir os seus rigores.”

949. O suicídio será desculpável, quando tenha por objetivo impedir que a vergonha caia sobre os filhos, ou sobre a família?
 “O que assim age, não faz bem, mas acredita que o faz e isso Deus lhe leva em conta, pois é uma expiação que a si mesmo impõe. Atenua a sua falta pela intenção, mas nem por isso deixa de cometer uma falta. De resto, aboli os abusos de vossa sociedade e vossos preconceitos e não haverá mais desses suicídios.”
Aquele que tira a própria vida, para escapar à vergonha de uma ação má, prova que valoriza mais a estima dos homens do que a de Deus, pois vai retornar à vida espiritual carregado das suas iniquidades e tendo-se privado dos meios de repará-las, durante a sua vida.
Deus é, frequentemente, menos inexorável do que os homens; ele perdoa ao que se arrepende sinceramente e leva em conta a reparação; o suicídio nada repara.

950. Que pensar daquele que tira a sua vida, na esperança de chegar mais depressa a uma vida melhor?
“Outra loucura! Que faça o bem e estará mais seguro de a ela chegar, pois, retardando sua entrada num mundo melhor, ele próprio pedirá para vir concluir esta vida que ele interrompeu, por um equívoco. Uma falta, qualquer que seja, nunca abre o santuário dos eleitos.”

951. O sacrifício da própria vida não é, algumas vezes, meritório, quando tem como objetivo salvar a de outrem, ou ser útil aos seus semelhantes?
“Isso é sublime, conforme a intenção, e o sacrifício da vida não constitui suicídio; mas Deus se opõe a um sacrifício inútil e não pode vê-lo com bons olhos, se ele é manchado pelo orgulho. Um sacrifício só é meritório pelo desinteresse e aquele que o pratica tem, algumas vezes, uma segunda intenção que lhe diminui o valor aos olhos de Deus.”
Todo sacrifício feito às custas de sua própria felicidade é um ato soberanamente meritório aos olhos de Deus, pois constitui a prática da lei de caridade. Ora, sendo a vida o bem terrestre pelo qual o homem tem maior apreço, aquele que a ela renuncia, pelo bem dos seus semelhantes, não comete um atentado: realiza um sacrifício. Mas, antes de fazê-lo, deve avaliar se sua vida não poderia ser mais útil do que sua morte.

952. O homem que perece vítima do abuso de paixões que ele sabia que deveriam apressar o seu fim, mas às quais não tinha mais o poder de resistir, porque o hábito as transformara em verdadeiras necessidades físicas, comete um suicídio?
“É um suicídio moral. Não compreendeis que, neste caso, o homem é duplamente culpado? Há nele falta de coragem e bestialidade e, além disso, o esquecimento de Deus.”

a) É mais ou menos culpado do que aquele que tira sua vida por desespero?
“Ele é mais culpado, porque tem tempo de refletir sobre seu suicídio; naquele que o faz instantaneamente, há, algumas vezes, uma espécie de desvario que se assemelha à loucura; o outro será muito mais punido, pois as penas são sempre proporcionais à consciência que se tem das faltas cometidas.”

953. Quando uma pessoa vê diante de si uma morte inevitável e terrível, é culpada por abreviar de alguns instantes seus sofrimentos, através de uma morte voluntária?
 “Somos sempre culpados por não esperar o termo fixado por Deus. Além disso, estaremos bem certos de que, apesar das aparências, esse termo tenha chegado e de que não poderemos receber um socorro inesperado, no último momento?”

a) Concebe-se que, nas circunstâncias comuns, o suicídio seja condenável, mas supomos o caso em que a morte é inevitável e em que a vida só é abreviada de alguns instantes.
“É sempre uma falta de resignação e de submissão à vontade do Criador.”

b) Quais são, nesse caso, as consequências desta ação?
“Uma expiação proporcional à gravidade da falta, conforme as circunstâncias, como sempre.”

954. Uma imprudência que compromete a vida, sem necessidade, é condenável?
“Não há culpabilidade, quando não há intenção, ou consciência perfeita de praticar o mal.”

955. As mulheres que, em certos países, se queimam voluntariamente sobre os corpos de seus maridos, podem ser consideradas suicidas e sofrem as consequências deste gesto?
“Elas obedecem a um preconceito e, frequentemente, mais à força do que pela sua própria vontade. Creem cumprir um dever e este não é o caráter do suicídio. A desculpa delas está na nulidade moral da maioria e na sua ignorância. Esses usos bárbaros e estúpidos desaparecem com a civilização.”

956. Aqueles que, não podendo suportar a perda de pessoas que lhes são caras, matam-se na esperança de ir juntar-se a elas, atingem o seu objetivo?
“O resultado para eles é completamente diferente daquele que esperavam e, em vez de se reunirem ao objeto de suas afeições, afastam-se dele por muito mais tempo, pois Deus não pode recompensar um ato de covardia e o insulto que lhe é feito, duvidando de sua Providência. Pagarão este instante de loucura com aflições maiores do que as que acreditavam abreviar e não terão, para compensá-las, a satisfação que esperavam.” (934 e seguintes)

957. Em geral, quais são as consequências do suicídio, relativamente ao estado de Espírito?
“As consequências do suicídio são muito diversas; não há penas fixas e, em todos os casos, são sempre relativas às causas que o produziram; mas existe uma consequência à qual o suicida não pode escapar: é o desapontamento. De resto, a sorte não é a mesma para todos: depende das circunstâncias; alguns expiam suas faltas imediatamente, outros, numa nova existência, que será pior do que aquela cujo curso interromperam.”
A observação mostra, de fato, que os efeitos do suicídio nem sempre são os mesmos; porém, há alguns comuns a todos os casos de morte violenta, consequência da interrupção brusca da vida. Primeiramente, há a persistência mais prolongada e mais tenaz do elo que une o Espírito ao corpo, porque esse elo está, quase sempre, na plenitude de sua força, no momento em que é partido, enquanto que, na morte natural, ele se enfraquece gradualmente e, frequentemente, se desfaz, antes que a vida esteja completamente extinta. As consequências desse estado de coisas são o prolongamento da perturbação espiritual, depois da ilusão que, durante um tempo mais ou menos longo, faz com que o espírito acredite que ainda pertence ao número dos vivos. (155 e 165)
A afinidade que persiste entre o Espírito e o corpo produz, em alguns suicidas, uma espécie de repercussão do estado do corpo no Espírito, que sente, assim, contra a vontade, os efeitos da decomposição, experimentando uma sensação cheia de angústias e de horror.
Este estado pode persistir, também, durante tanto tempo quanto devesse durar a vida que interromperam. Tal efeito não é geral; mas, em nenhum caso, o suicida fica isento das consequências da sua falta de coragem e, cedo ou tarde, expia seu erro, de um jeito ou de outro. É assim que alguns Espíritos, que tinham sido muito infelizes na Terra, disseram ter-se suicidado na existência anterior e submetido, voluntariamente, a novas provas, para tentar suportá-las com mais resignação. Em alguns, há uma espécie de ligação à matéria, de que procuram, em vão, desembaraçar-se, para voarem para mundos melhores, cujo acesso lhes está interditado; na maioria, há o pesar de ter feito uma coisa inútil, já que só decepções experimentam.
A religião, a moral, todas as filosofias condenam o suicídio como contrário à lei natural; todas nos dizem, em princípio, que ninguém tem o direito de abreviar, voluntariamente, a sua vida; mas, por que não temos esse direito? Por que não somos livres para pôr um termo aos nossos sofrimentos? Estava reservado ao Espiritismo demonstrar, pelo exemplo dos que sucumbiram, que não se trata apenas de uma falta representativa de infração a uma lei moral, consideração de pouco peso para alguns indivíduos, mas de um ato estúpido, visto que nada se ganha com ele, longe disso; não é a teoria que ele nos ensina, são os fatos que nos patenteia.
Extraído do livro dos Espíritos de Allan Kardec. 1. ed. — Rio de Janeiro: CELD, 2008.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:


KARDEC, Allan. A Gênese: os milagres e as predições segundo o Espiritismo. Trad. de Guillon Ribeiro da 5. ed. francesa. 48. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005.
______. O céu e o inferno ou A Justiça divina segundo o Espiritismo. Trad. de Manuel Justiniano Quintão. 57. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005.
______. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. de Guillon Ribeiro da 3. ed. francesa rev., corrig. e modif. pelo autor em 1866. 124. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004.
______. O Livro dos Espíritos: princípios da Doutrina Espírita. Trad. de Guillon Ribeiro. 86. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005.

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