Cap. IX – Itens 8 a 10
Obediência e resignação
A doutrina de Jesus
ensina, por toda a parte, a obediência e a resignação, duas virtudes que
acompanham a doçura, e que são muito ativas, embora os homens as confundam,
erradamente, com a negação do sentimento e da vontade. A obediência é o
consentimento da razão; a resignação é o consentimento do coração. As duas são forças
ativas, pois levam o fardo das provas que a revolta insensata deixa cair. O
covarde não pode ser um resignado, assim como o orgulhoso e o egoísta não podem
ser criaturas obedientes. Jesus foi a encarnação dessas virtudes que a antiguidade
materialista desprezava. Ele veio no momento em que a sociedade romana
naufragava nos desmandos da corrupção; Ele veio fazer brilhar, no meio da humanidade
oprimida, os triunfos do sacrifício e da renúncia à sensualidade.
Cada época é marcada
pela virtude ou pelo vício que deverão salvá-la ou perdê-la. A virtude da vossa
geração é a atividade intelectual; seu vício é a indiferença moral. Digo, somente,
atividade, porque o gênio se eleva de repente e descobre, sozinho, os
horizontes que a multidão só verá depois dele, enquanto que a atividade é a
reunião dos esforços de todos para atingir um objetivo menos brilhante, mas que
prova a elevação intelectual de uma época. Submetei-vos ao impulso que viemos
dar aos vossos espíritos; obedecei à grande lei do progresso, que é a palavra
da vossa geração. Infeliz do espírito preguiçoso, daquele que fecha o seu
entendimento! Infeliz dele! Porque nós, que somos os guias da humanidade em
marcha, o chicotearemos, e forçaremos a sua vontade rebelde, com o duplo
esforço do freio e da espora; mais cedo ou mais tarde toda a resistência
orgulhosa deverá ceder, mas bem-aventurados os que são mansos, porquanto
ouvirão docilmente os ensinamentos. (Lázaro. Paris, 1863.)
A cólera
9. O orgulho faz com
que a criatura se julgue superior ao que é realmente, e não suporte passar por
uma comparação que possa rebaixá-la; faz também com que se considere de tal
forma acima dos seus semelhantes, seja em aptidões, seja em posição social,
seja em vantagens pessoais que o menor paralelo a irrita e a fere; e então o
que acontece? Ela se entrega à cólera.
Procurai a origem
desses acessos de demência passageira, que vos fazem perder o sangue frio e a
razão e vos assemelham ao bruto; procurai, e quase sempre achareis o orgulho
ferido como base de tudo. Não é o amor-próprio que, ferido por uma contradição,
vos faz rejeitar observações justas, e repudiar com cólera os mais sábios
conselhos? Até mesmo as impaciências, causadas por contrariedades, muitas vezes
pueris, dependem da importância que atribuís à personalidade, diante da qual
julgais que todos se devem curvar.
No seu desvario, o
homem colérico se revolta contra tudo, desde a natureza bruta aos objetos
inanimados que ele quebra porque não lhe obedecem. Ah, se nesses momentos ele
pudesse se ver a sangue frio, teria pena de si mesmo, ou se acharia bem
ridículo. Que julgue por aí, a impressão que deve causar nos outros. Ainda que
seja por respeito a si mesmo, ele deveria se esforçar para vencer uma tendência
que o faz digno de piedade.
Se pensasse que a
cólera não serve para nada, que altera a saúde, compromete até a sua vida, ele
perceberia que é a sua primeira vítima; mas existe ainda uma consideração que
deveria detê-lo: o pensamento de que torna infelizes todos aqueles que o cercam.
Se tem coração, não deve sentir remorsos por fazer sofrer as pessoas que mais
ama? E que remorso mortal não sentiria se, em um acesso de fúria, cometesse um
ato do qual tivesse que se arrepender por toda a sua vida.
Em suma, a cólera
não exclui certas qualidades do coração, mas impede que se pratique muito mais
o bem permitindo que se possa fazer muito mais o mal. Isso deve ser suficiente
para induzir o homem a empreender esforços para dominá-la. O espírita, aliás, é
induzido a isso por outro motivo, o de que a cólera é contrária à caridade e à
humildade cristãs. (Um espírito protetor. Bordeaux, 1863.)
10. De acordo com a ideia,
completamente falsa, de que não pode reformar a sua própria natureza, o homem acredita
que não tem obrigação de fazer esforços para se corrigir dos defeitos nos quais
ele se compraz voluntariamente ou que, para serem eliminados, exigiriam muita
perseverança. É assim, por exemplo, que o homem com tendência à cólera quase
sempre se desculpa por seu temperamento. Em vez de reconhecer a sua culpa, ele
transfere a falha para o seu organismo, acusando, dessa forma, a Deus por seus
próprios defeitos. É ainda uma consequência do orgulho que se encontra misturado
a todas as suas imperfeições.
Sem a menor dúvida,
existem temperamentos que se prestam mais que outros a atos violentos, assim
como existem músculos mais flexíveis que se prestam melhor a grandes esforços.
Não acrediteis, porém, que aí se encontre a principal causa da cólera; ficai
certos de que um espírito pacífico, mesmo em um corpo irascível, será sempre
pacífico, e que um espírito violento, mesmo em um corpo sem energia, não será
brando. A violência somente tomará uma outra característica, porquanto, não
tendo um organismo próprio para manifestá-la, a cólera ficará contida, enquanto
que no outro caso se mostrará livremente.
O corpo não dá
impulsos de cólera a quem não a possui, assim como não dá outros vícios. Todas
as virtudes e todos os vícios são inerentes ao espírito, sem isso onde estaria
o mérito e a responsabilidade? O homem que é deformado não pode tornar-se
direito, porque o espírito não tem nada com isso, mas ele pode modificar o que
é do espírito quando tem uma vontade firme. A experiência não vos prova,
espíritas, até onde pode ir o poder da vontade, pelas transformações
verdadeiramente miraculosas que vedes acontecer? Dizei, pois, que o homem permanece vicioso
porque quer ficar vicioso; mas aquele que deseja se corrigir sempre pode fazê-lo, se assim
não fosse, a lei do progresso não existiria para o homem. (Hahnemann.(83) Paris, 1863.)
Questões para estudo:
1 – Por que está
incorreto compreender a obediência e a resignação como sendo a negação do
sentimento e da vontade?
2 – O que podemos
fazer para evitar os acessos de cólera?
3 – Extraia do texto
acima a frase ou parágrafo que mais gostou e justifique.
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