quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Cap. XXVIII – Itens 59 a 63
Por alguém que acaba de morrer


59. PREFÁCIO. As preces pelos Espíritos que acabam de deixar a Terra não objetivam, unicamente, dar-lhes um testemunho de simpatia: também têm por efeito auxiliar-lhes o desprendimento e, desse modo, abreviar-lhes a perturbação que sempre se segue à separação, tornando-lhes mais calmo o despertar. Ainda aí, porém, como em qualquer outra circunstância, a eficácia está na sinceridade do pensamento e não na quantidade das palavras que se profiram mais ou menos pomposamente e em que, amiúde, nenhuma parte toma o coração.
As preces que deste se elevam ressoam em torno do Espírito, cujas ideias ainda estão confusas, como as vozes amigas que nos fazem despertar do sono. (Cap. XXVII, n° l0.)

60. Prece. - Onipotente Deus, que a tua misericórdia se derrame sobre a alma de N..., a quem acabaste de chamar da Terra. Possam ser-lhe contadas as provas que aqui sofreu, bem como ter suavizadas e encurtadas as penas que ainda haja de suportar na Espiritualidade!
Bons Espíritos que o viestes receber e tu, particularmente, seu anjo guardião, ajudai-o a despojar-se da matéria; dai-lhe luz e a consciência de si mesmo, a fim de que saia presto da perturbação inerente à passagem da vida corpórea para a vida espiritual. inspirai-lhe o arrependimento das faltas que haja cometido e o desejo de obter permissão pata as reparar, a fim de acelerar o seu avanço rumo à vida eterna bem-aventurada.
N..., acabas de entrar no mundo dos Espíritos e, no entanto, presente aqui te achas entre nós; tu nos vês e ouves, por isso que de menos do que havia, entre ti e nós, só há o corpo perecível que vens de abandonar e que em breve estará reduzido a pó.
Despiste o envoltório grosseiro, sujeito a vicissitudes e à morte, e conservaste apenas o envoltório etéreo, imperecível e inacessível aos sofrimentos. Já não vives pelo corpo; vives da vida dos Espíritos, vida essa isenta das misérias que afligem a Humanidade.
Já não tens diante de ti o véu que às nossas vistas oculta os esplendores da vida no Além. Podes, doravante, contemplar novas maravilhas, ao passo que nós ainda continuamos mergulhados em trevas.
Vais, em plena liberdade, percorrer o espaço e visitar os mundos, enquanto nós rastejaremos penosamente na Terra, à qual se conserva preso o nosso corpo material, semelhante, para nós, a pesado fardo.
Diante de ti, vai desenrolar-se o panorama do Infinito e, em face de tanta grandeza, compreenderás a vacuidade dos nossos desejos terrestres, das nossas ambições mundanas e dos gozos fúteis com que os homens tanto se deleitam.
A morte, para os homens, mais não é do que uma separação material de alguns instantes. Do exílio onde ainda nos retém a vontade de Deus, bem assim os deveres que nos correm neste mundo, acompanhar-te-emos pelo pensamento, até que nos seja permitido juntar-nos a ti, como tu te reuniste aos que te precederam.
Não podemos ir onde te achas, mas tu podes vir ter conosco. Vem, pois, aos que te amam e que tu amaste; ampara-os nas provas da vida; vela pelos que te são caros; protege-os, como puderes; suaviza-lhes os pesares, fazendo-lhes perceber, pelo pensamento, que és mais ditoso agora e dando-lhes a consoladora certeza de que um dia estareis todos reunidos num mundo melhor.
Nesse, onde te encontras, devem extinguir-se todos os ressentimentos. Que a eles, daqui em diante, sejas inacessível, a bem da tua felicidade futura! Perdoa, portanto, aos que hajam incorrido em falta para contigo, como eles te perdoam as que tenhas cometido para com eles.

Nota. - Podem acrescentar-se a esta prece, que se aplica a todos, algumas palavras especiais, conforme as circunstâncias particulares de família ou de relações, bem como a posição social que ocupava o defunto.
Se se trata de uma criança, ensina-nos o Espiritismo que não está ali um Espírito de criação recente, mas um que já viveu e que pode, mesmo, já ser muito adiantado. Se foi curta a sua última existência, é que não devia passar de um complemento de prova, ou constituir uma prova para os pais. (Cap.V, n° 21.)

61. (Outra) - (1). Senhor onipotente, que a tua misericórdia se estenda sobre os nossos irmãos que acabam de deixar a Terra! Que a tua luz brilhe para eles! Tira-os das trevas; abre-lhes os olhos e os ouvidos! Que os bons Espíritos os cerquem e lhes façam ouvir palavras de paz e de esperança!

(1) Esta prece foi ditada a um médium de Bordéus, na ocasião em que passava pela sua casa o féretro de um desconhecido.
Senhor, ainda que muito indignos, ousamos implorar a tua misericordiosa indulgencia para este irmão nosso que acaba de ser chamado do exílio. Faze que o seu regresso seja o do filho pródigo. Esquece, ó meu Deus, as faltas que haja cometido, para te lembrares somente do bem que haja praticado. Imutável é a tua justiça, nós o sabemos; mas, imenso é o teu amor. Suplicamos-te que abrandes aquela, na fonte de bondade que emana do teu seio.
Brilhe a luz para os teus olhos, irmão que vens de deixar a Terra! Que os bons Espíritos de ti se aproximem, te cerquem e ajudem a romper as cadeias terrenas! Compreende e vê a grandeza do nosso Senhor: submete-te, sem queixumes, à sua justiça, porém, não desesperes nunca da sua misericórdia. Irmão! que um sério retrospecto do teu passado te abra as portas do futuro, fazendo-te perceber as faltas que deixas para trás e o trabalho cuja execução te incumbe para as reparares! Que Deus te perdoe e que os bons Espíritos te amparem e animem. Por ti orarão os teus irmãos da Terra e pedem que por eles ores.

Pelas pessoas a quem tivemos afeição



62. PREFÁCIO. Que horrenda é a ideia do Nada! Quão de lastimar são os que acreditam que no vácuo se perde, sem encontrar eco que lhe responda, a voz do amigo que chora o seu amigo! Jamais conheceram as puras e santas afeições os que pensam que todo morre com o corpo; que o gênio, que com a sua vasta inteligência iluminou o mundo; é uma combinação de matéria, que, qual sopro, se extingue para sempre; que do mais querido ente, de um pai, de uma mãe, ou de um filho adorado não restará senão um pouco de pó que o vento irremediavelmente dispersará.
Como pode um homem de coração conservar-se frio a essa ideia? Como não o gela de terror a ideia de um aniquilamento absoluto e não lhe faz, ao menos, desejar que não seja assim? Se até hoje não lhe foi suficiente a razão para afastar de seu espírito quaisquer dúvidas, aí está o Espiritismo a dissipar toda incerteza com relação ao futuro, por meio das provas materiais que dá da sobrevivência da alma e da existência dos seres de além-túmulo. Tanto assim é que por toda a parte essas provas são acolhidas com júbilo; a confiança renasce, pois que o homem doravante sabe que a vida terrestre é apenas uma breve passagem conducente a melhor vida; que seus trabalhos neste mundo não lhe ficam perdidos e que as mais santas afeições não se despedaçam sem mais esperanças. (Cap. IV, n° 18; Cap. V, n° 21.)

63. Prece. - Digna-te, ó meu Deus, de acolher, benévolo, a prece que te dirijo pelo Espírito N... Faze-lhe entrever as claridades divinas e torna-lhe fácil o caminho da felicidade eterna. Permite que os bons Espíritos lhe levem as minhas palavras e o meu pensamento.
Tu, que tão caro me eras neste mundo, escuta a minha voz, que te chama para te oferecer novo penhor da minha afeição. Permitiu Deus que te libertasses antes de mim e eu disso me não poderia queixar sem egoísmo, porquanto fora querer-te sujeito ainda às penas e sofrimentos da vida. Espero, pois, resignado, o momento de nos reunirmos de novo no mundo mais venturoso no qual me precedeste.
Sei que é apenas temporária a nossa separação e que, por mais longa que me possa parecer, a sua duração nada é em face da ditosa eternidade que Deus promete aos seus escolhidos. Que a sua bondade me preserve de fazer o que quer que retarde esse desejado instante e me poupe assim à dor de te não encontrar, ao sair do meu cativeiro terreno.
Oh! quão doce e consoladora é a certeza de que não há entre nós mais do que um véu material que te oculta às minhas vistas! de que podes estar aqui, ao meu lado, a me ver e ouvir como outrora, senão ainda melhor do que outrora; de que não me esqueces, do mesmo modo que eu te não esqueço; de que os nossos pensamentos constantemente se entreluzam e que o teu sempre me acompanha e ampara.
Que a paz do Senhor seja contigo.

Questões para estudo e diálogo virtual:

1 - Cite objetivos das preces pelos Espíritos que acabam de deixar a Terra?

2 - Busque, no texto, ideias a favor da necessidade da existência de algo mais além da matéria.

3 - Extraia do texto acima a frase ou parágrafo que mais gostou e justifique.


Prece da criança que ainda não nasceu



Emmanuel
Mãe querida!...
Sustenta-me agora para que eu te sustente depois.
Não me expulses, nem me desprezes.
Venho ao encontro de tuas esperanças.
Junto de ti, estou na condição de anseio de teu anseio e de alma de tua alma.
Hoje, sou apenas flor, sonho, pensamento...
Amanhã, serei a tua própria realização.
Resguarda-me com amor para que a confiança não me abandone.
Protege-me contra o desequilíbrio.
Cultiva as ideias positivas do bem para que não me falte segurança contra o mal.
Guarda-me no colo, em nome de Deus, para que a luz da fé em Deus se mantenha acesa dentro de mim.
Tenho tanta necessidade de ti, quanto a semente precisa da terra para germinar e viver.
Dá-me a tua bondade e dar-te-ei a mim mesmo.
De ti depende que eu possa estar amanhã, entre os homens, a fim de cooperar na construção do Mundo Melhor.

domingo, 23 de fevereiro de 2014

A QUARTA FORÇA



Definição e conceito. O homem psicológico maduro.
Modelos e paradigmas. A nova estrutura do ser humano

Os estudiosos da criatura humana, embora os rígidos controles exercidos pelas conquistas freudianas, anelavam por ampliar os horizontes da compreensão em torno de fenômenos complexos e abrangentes, transumanos, capazes de elucidar problemas profundos da personalidade.
As explicações junguianas amplas, procurando enfeixar nos arquétipos todas as ocorrências ela paranormalidade, deixaram espaços para reformulações de conceitos e especulações que se libertam dos modelos e paradigmas acadêmicos, atendendo com mais cuidado, e observações menos ortodoxas, os acontecimentos desprezados, por considerados patológicos ou fraudulentos.
Vez que outra, surgiram ensaios e tentativas de ampliação de conteúdos, como efeito das experiências de Rhine, Wilber, Grof, Kübler Ross, Moody Jr., Maslow, Walsh, Vaughan, Assagioli, Capra e outros corajosos pioneiros, que se preocuparam em ir além dos padrões estabelecidos, penetrando a sonda da investigação no inconsciente e concluindo por novas realidades, antes execradas, lentamente acumulando dados capazes de suportar refutação, crítica e desprezo.
Era necessário revisar o potencial humano em toda a sua complexidade, sem preconceitos nem receias.
As teorias apressadas, que pretendiam reduzir a alma a um epifenômeno de vida efêmera, vinham sendo superadas pelas pesquisas de laboratório na área da Parapsicoloqia,' da Psicobiofísica, da Psicotrônica e da Ciência Espírita, cujos dados valiosos avolumaram­se de tal forma, com a contribuição da Transcomunicação Instrumental, que não havia outra alternativa senão ampliar o esquema de interpretação do psiquismo, criando-se o que se convencionou denominar como a Quarta Força - além do Comportamentalismo (Behaviorismo), da Psicanálise e da Psicologia Humanista - que é a Psicologia Transpessoal ou profunda.
Indispensável coragem para enfrentar o cepticismo e a arrogância dos acadêmicos, dos reducionistas que, mesmo diante do numinoso, de Jung, permaneciam aferrados ao organicismo e à hereditariedade, aos fatores derivados das pressões de toda ordem, às sequelas das enfermidades infecciosas, aos traumatismos físicos e psicológicos....
Os avanços da Física Quântica, a Relatividade do Tempo e do Espaço, a Teoria da Incerteza, abriram perspectivas psicológicas dantes sequer sonhadas, tendo-se em vista o conceito do vir-a-ser.
A abrangência da consciência como estágio mais levado do processo antropológico-sociológico-psicológico do ser, passou a exigir mais acurada penetração, ampliando o quadro de entendimento dos dementes (autist savant ou sábio idiota), portadores de capacidades e aptidões luminosas, perturbadoras... Revelando-se matemáticos, músicos, artistas plásticos, linguistas que, de repente, romperam o véu do silêncio e passaram a comunicar-se com lucidez, apresentando dotes de excepcional capacidade realizadora, puseram-se a exigir elucidações que destruam as tradições negativas, atualizando a predominância do Espírito sobre a matéria, da mente sobre' o cérebro gravemente danificado, assim demonstrando que preexistem aos órgãos e os sobrevivem, ao invés de serem suas elaborações ou efeitos dos seus mecanismos.
A grandiosa contribuição do pensamento oriental, de Buda a Vivekananda, a Ramakrishna e outros, dos taoístas tibetanos aos físicos nucleares, enseja a revisão dos parâmetros aceitos, bem como dos modelos estabelecidos, propondo a identificação de fórmulas com aparência diversa, no entanto, que se harmonizam, unindo as duas culturas - a do passado e a do presente - em uma síntese perfeita, em favor de um homem e de uma mulher holísticos, completos, ao revés de examinados em partes.
Esse concurso que se vinha insinuando multissecularmente, logrou impor-se através das terapias liberadoras de conflitos, tais a meditação, a respiração, a oração, a magnetização da água, a bioenergia, os exercícios da tai-chi-chuan, o controle mental de inegáveis resultados nas mais variadas áreas do comportamento, do inter-relacionamento pessoal, da saúde ...
Os diques erguidos pela intolerância romperam­se ante as novas conquistas, e as técnicas regressivas da memória, com exclusiva definição terapêutica, o uso de algumas drogas psicodélicas como o ácido lisérgico, a hipnose, demonstraram que muitos fatores psicopatogênicos são anteriores à concepção do ser, eliminando a predominância genética na condição de desencadeadora de psicoses, neuroses, conflitos e tormentos degeneradores da personalidade...
A telepatia, a clarividência, os fenômenos retro e precognitivos, as ectoplasmias, os deslocamentos de objetos sem contatos e outros facultaram mais acurados exames do indivíduo, que a análise transpessoal pode abordar com segurança ou neles apoiar­se, a fim de solucionar os enigmas predominantes em pacientes marginalizados pelas outras correntes da Psicologia ou facilmente rotulados de psicopatas.
O ser humano é constituído de elementos complexos, que escapam a uma observação superficial.
A conceituação materialista de forma alguma atende-lhe as necessidades éticas e sociológicas, não logrando elucidar o ser psicológico, exceto quando, ignorando-lhe a realidade transcendente, relega-a à indiferença, à desconsideração catalogada de patologia irreversível.
O ser dual - Espírito e matéria - do espiritualismo ortodoxo, permanece incompleto, deixando escapar incontáveis expressões de conteúdo, por falta do elemento intermediário, processador de inúmeros fenômenos que lhe completam a existência.
Somente quando estudado na sua plenitude ­ Espírito, perispírito e matéria - podem-se resolver todos os questionamentos e desafios que o compõem, alargando-lhe as possibilidades de desenvolvimento do deus interno, facultando completude, realização plenificadora, estado de Nirvana, de samadhi, ou de reino dos Céus que lhe cumpre alcançar.
Essa gigantesca tarefa cabe à moderna Psicologia Transpessoal ou Quarta Força, que inicia um período de real compreensão da criatura como ser indestrutível que é, fadado à felicidade.

Definição e conceito

Definir, de alguma forma, é limitar, restringir. Mesmo quando as definições são elásticas, reduzem o pensamento e o enclausuram em palavras, retendo as largas possibilidades que necessitam ser penetradas.
Conceituando a psicologia transpessoal, não nos podemos furtar aos seus paradigmas, que ampliam as linhas das definições clássicas da doutrina psicológica em si mesma, de modo a dar-lhe a abrangência que alcança o ser humano na sua estrutura física, psíquica e transcendental.
Remontando-se à história do pensamento psicológico, encontraremos os seus primeiros postulados na ética filosófica ancestral, que se iniciou no ocidente com Anaxímenes e Anaxágoras, percorrendo todos os períodos históricos até a sua formação organicista, na segunda metade do século XIX, e prosseguindo pelas várias escolas freudiana, junguiana, adleriana, enquanto se ia ampliando nas concepções humanista, comportamentalista e psicanalítica.
Nos seus primórdios, a ciência da alma encontrava-se embutida nos conceitos socráticos e platônicos, preocupados com a criatura humana dual, cujas origens se encontravam no mundo das ideias, para onde retornava após o périplo carnal, a fim de experimentar felicidade ou desdita.
A sua ética moral, otimista, estimulava ao equilíbrio mente-corpo, conduta saudável e solidariedade com as demais criaturas.
Procedente de uma realidade metafísica, o ser a ela retornava com o somatório das experiências adquiridas, que lhe plasmariam futuros renas cimentos na Terra, conforme os conteúdos existenciais vividos.
Nessa paisagem, o planeta terrestre pode ser considerado uma escola, na qual se forma e aprimora o caráter, desenvolvendo o germe divino que nele dorme, qual ocorre na semente com o vegetal...
Posteriormente, Aristóteles lhe agregou a enteléquia, e propôs uma criatura trinária, seguindo os modelos da filosofia oriental e recusando-se à aceitação dos episódios reencamacionistas necessários à evolução.
Concomitantemente, as propostas atomistas reduziam o ser humano ao amontoado de partículas infinitamente pequenas, esféricas, com ganchos, segundo uns, ou deles destituídos, conforme outros, unindo-se e desestruturando-se graças ao vácuo e ao movimento, resultando, portanto, do capricho do acaso que os reúne e desagrega, produzindo vida e morte ao sabor das ocorrências anômalas, eventuais.
Avançando, paralelamente, em antagonismo estrutural, alcançaram culminâncias ora uma, ora outra corrente, através de São Tomaz de Aquino ou de Leibniz, de Descartes ou Bacon ...
Enquanto o pensamento oriental estruturava o fenômeno psicológico em um ser herdeiro de Deus e a Ele semelhante, isto é, portador de recursos inimagináveis que lhe cabe desenvolver, ampliaram-se as concepções em torno do universo, da criação, da vida, muito antes que a cultura ocidental se apercebesse da causalidade do existir.
Como verdadeiro ponto de equilíbrio apareceu o pensamento ético de Jesus, colocando uma ponte psicológica e filosófica entre as duas civilizações, desenvolvendo o idealismo socrático e o reencamacionismo do vedanta e do budismo, então fecundado pelo amor, único tesouro que logra produzir a plenificação do ser humano.
Psicoterapeuta superior, Jesus não foi apenas o filósofo e o psicólogo que compreendeu os problemas humanos e ensejou conteúdos libertadores, mas permanece como terapeuta que rompeu as barreiras da personalidade dos pacientes e penetrou-lhes a consciência de onde arrancou a culpa, a fim de proporcionar a catarse salvadora e a recomposição da individualidade aturdida, quando não em total infelicidade.
Possuidor de transcendente capacidade de penetração nos arquivos do inconsciente individual e coletivo, Ele tornou-se o marco mais importante da psicologia transpessoal, por adotar a postura mediante a qual considera o indivíduo um ser essencialmente espiritual, em transitória existência física, que faz parte do seu programa de autoburilamento.
Conscientizando as criaturas a respeito da sua responsabilidade pessoal diante da vida, estabeleceu terapias de invulgar atualidade, trabalhando a estruturação da personalidade, com o passo de segurança para a aquisição da consciência.
No postulado não fazer ao próximo o que não deseja que ele lhe faça, estatuiu a condição de segurança para a identificação do indivíduo consigo mesmo, com o seu irmão e com o mundo no qual se encontra, proporcionando urna ética simples e facilmente aplicável, no inter-relacionamento pessoal, sem conflito nem culpa.
Da mesma forma, propondo o auto aperfeiçoamento pela superação das paixões dissolventes, trouxe o futuro para o presente, tornando o reino dos céus um estado de consciência lúcida, longe do sono, do sonho e das psicoses totalmente superadas.
O Cristianismo, no entanto, através dos tempos, sofrendo as injunções dos pseudoconversos, invariavelmente portadores de grandes traumas e conflitos, procurou castrar e coibir todas as fontes de prazer, as expressões existenciais, mediante regras e dogmas punitivos, que se caracterizaram pela repressão, restrição e condenação.
Não obstante os luminares que, de vez em quando, buscaram libertar os indivíduos do temor e do ódio, levando-os à confiança e ao amor, quais São Francisco de Assis, Santa Tereza de Ávila e alguns outros, predominaram a ignorância e o terror, produzindo urna consciência de culpa coletiva, verdadeiro arquétipo de natureza punitiva, que venceu as gerações e ressurge, ainda hoje, nos indivíduos e grupamentos sociais, fazendo-os responsáveis pelo deicídio no Calvário - confundindo Jesus com Deus - ou, mais remotamente, com a herança da tentação, em que Eva tombou, levando Adão ao erro, assim tornando a mulher inferior no processo humano da evolução, em flagrante desrespeito ao simbolismo da criação humana, que passou à condição de realidade.
O culto ao mito, ao símbolo, ao fantasioso, à aceitação do modelo, são necessidades psicológicas, para os mecanismos de transferência da realidade e fugas da consciência responsável.
Assumindo a postura teológica, responde por males que se repetem milenarmente, possibilitando alienações e desditas inimagináveis.
- A evolução das ciências vem logrando anular esse efeito pernicioso, e, graças ao advento da psicologia espírita com Allan Kardec, recupera-se o ser humano do conflito em que se encontrava, promovendo-o à condição de possuidor de valores preciosos que lhe cumpre desenvolver, embora a esforço de trabalho paciente e constante.
A quarta força, alargando as imensas possibilidades da psicologia, faz que sejam descortinadas as possibilidades ímpares para a perfeita integração da criatura com o seu Criador, e da sua com a Consciência Cósmica, pulsante e universal.
Nesse homem transpessoal cantam, então, as glórias da vida e se dilatam os dons nele existentes, em pleno desenvolvimento da sua realidade, que supera as culpas e as dores, as angústias e as inquietações, tornando-o pleno e feliz.




O Ser Consciente



Esmagado por conflitos que não amainam de intensidade, o homem moderno procura mecanismos escapistas, em vãs tentativas de driblar as aflições transferindo-se para os setores do êxito exterior, do aplauso e da admiração social, embora os sentimentos permaneçam agrilhoados e ferreteados pela angústia e pela insatisfação.
As realizações externas podem acalmar as ansiedades do coração, momentaneamente, não, porém, erradicá-las, razão por que o triunfo externo não apazigua interiormente.
Condicionado para a conquista das coisas, na concepção da meta plenificadora, o indivíduo procura soterrar os conflitos sob as preocupações contínuas, mantendo-os, no entanto, vivos e pulsantes, até quando ressumam e sobrepõem-se a todos os disfarces, desencadeando novos sofrimentos e perturbações devastadoras.
O homem pode e deve ser considerado como sendo sua própria mente.
Aquilo que cultiva no campo íntimo, ou que o propele com insistência a realizações, constitui a sua essência e legitimidade, que devem ser estudadas pacientemente, a fim de poder enfrentar os paradoxos existenciais - parecer e ser-, as inquietações e tendências que o comandam, estabelecendo os paradigmas corretos para a jornada, liberado dos choques interiores em relação ao comportamento externo.
Ignorar uma situação não significa eliminá-la ou superá-la. Tal postura permite que os seus fatores constitutivos cresçam e se desenvolvam, até o momento em que se tornam insustentáveis, chamando a atenção para enfrentá-los.
O mesmo ocorre com os conflitos psicológicos. Estão presentes no homem, que, invariavelmente, não lhes dá valor, evitando deter-se neles, analisar a própria fragilidade, de modo a encontrar os recursos que lhe facultem diluí-los.
Enraizados profundamente, apresentam-se na consciência sob disfarces diferentes, desde os simples complexos de inferioridade, os narcisismos, a agressividade, a culpa, a timidez, até os estados graves de alienação mental.
Todo conflito gera insegurança, que se expressa multifacetadamente, respondendo por inomináveis comportamentos nas sombras do medo e das condutas compulsivas.
Suas vítimas padecem situações muito afligentes, tombando no abandono de si mesmas, quando as resistências disponíveis se exaurem.
O ser consciente deve trabalhar-se sempre, partindo do ponto inicial da sua realidade psicológica, aceitando-se como é e aprimorando-se sem cessar.
Somente consegue essa lucidez aquele que se autoanalise, disposto a encontrar-se sem máscara, sem deterioração. Para isso, não se julga, nem se justifica, não se acusa nem se culpa. Apenas descobre-se.
À identificação segue-se o trabalho da transformação interior para melhor, utilizando-se dos instrumentos do auto amor, da autoestima, da oração que estimula a capacidade de discernimento, da relaxação que libera das tensões, da meditação que faculta o crescimento interior.
" O auto amor ensina-o a encontrar-se e desvela os potenciais de força íntima nele jacentes.
A alo-estima leva-o à fraternidade, ao convívio saudável com o seu próximo, igualmente necessitado.
A oração amplia-lhe a faculdade de entendimento da existência e da Vida real.
A relaxação proporciona-lhe harmonia, horizontes largos para a movimentação.
A meditação ajuda-o a crescer de dentro para fora, realizando-se em amplitude e abrindo-lhe a percepção para os estados alterados de consciência.
O autoconhecimento se torna uma necessidade prioritária na programática existencial da criatura. Quem o posterga, não se realiza satisfatoriamente, porque permanece perdido em um espaço escuro, ignorado dentro de si mesmo.
Foi necessário que surgissem a Psicologia Transpessoal e outras áreas doutrinárias com paradigmas bem definidos a respeito do ser humano integral, para que se pudesse propor à vida melhores momentos e mais amplas perspectivas de felicidade.
A contribuição da Parapsicologia, da Psicobiofísica, da Psicotrônica, ampliou os horizontes do homem, propiciou­lhe o encontro com outras dimensões da vida e possibilidades extrafísicas de realização, que permaneciam soterradas sob os escombros do inconsciente profundo, ou adormecidas nos alicerces da Consciência.
Antes, porém, de todas essas disciplinas psicológicas e doutrinas parapsíquicas, o Espiritismo descortinou para a criatura a valiosa possibilidade de ser consciente, concitando-a ao auto-encontro e à autodescoberta a respeito da vida além dos estreitos limites materiais.
Perfeitamente identificado com os elevados objetivos da existência terrestre do ser humano, Allan Kardec questionou os Espíritos Benfeitores: "Qual o meio prático mais eficaz que tem o homem de se melhorar nesta vida e de resistir à atração do mal?"
Eles responderam: «: Um sábio da antiguidade vo-lo disse: Conhece-te a ti mesmo."!')
Comentando a resposta, Santo Agostinho, Espírito, entre outras considerações explicitou: " ... 0 conhecimento de si mesmo é, portanto, a chave do progresso individual. Mas, direis, como há de alguém julgar-se a si mesmo? Não está aí a ilusão do amor-próprio para atenuar as faltas e torná-las desculpáveis? O avarento se considera apenas econômico e previdente; o orgulhoso julga que em si só há dignidade. Isto é muito real, mas tendes um meio de verificação que não pode iludir-vos. Quando estiverdes indecisos sobre o valor de uma de vossas ações, inquiri como a qualificarieis se praticada por outra pessoa ... ". "E prosseguiu: " ... dê balanço no seu dia moral para, a exemplo do comerciante, avaliar suas perdas e seus lucros, e eu vos asseguro que a conta destes será mais avultada que a daquelas. Se puder dizer que foi bom o seu dia, poderá dormir em paz e aguardar sem receio o despertar na outra vida. "
Na análise diária e contínua dos atos, o auto e o alo­amor serão decisivos para a avaliação. A oração e a meditação irão constituir recurso complementar para afixação das conquistas.
Quem ora, fala; quem medita, ouve, dispondo dos recursos para exteriorizar-se e interiorizar-se.
Há, no entanto, estruturas psicológicas muito frágeis ou assinaladas por distúrbios de comportamento grave. Nesses casos, urge o concurso da Ciência Espírita, com as terapias profundas que dispõe; e, de acordo com a intensidade do distúrbio, torna-se necessária a ajuda do psicoterapeuta, conforme a especificidade do problema, que será equacionado pela Psicologia, pela Psicanálise ou pela Psiquiatria.
Em muitos conflitos humanos, entretanto, ocorrem interferências espirituais variadas, gerando quadros de obsessões complexas, para os quais somente as técnicas espíritas alcançam os resultados desejados, por se tratarem, esses agentes perturbadores, de Entidades extracorpóreas, porém portadores dos mesmos potenciais das suas vítimas: sentimentos e emoções, inteligência e lucidez, experiências e vidas.
*
O ser consciente é austero, mas sem carranca; é jovial, porém sem vulgaridade; é complacente, no entanto sem conivência; é bondoso, todavia sem anuência com o erro. Ajuda e promove aquele que lhe recebe o socorro, seguindo adiante sem cobrar retribuição.
É responsável, e não se permite o vão repouso enquanto o dever o aguarda. Conhecendo suas possibilidades, colocassem ação sempre que necessário, aberto ao amor e ao bem.
Só o amadurecimento psicológico, através das experiências vividas, libera a consciência do ser, e, ao consegui-la, ei-lo feliz, conquistando a Terra da Promissão bíblica.
*
Este modesto livro, que ora trazemos à análise do caro Leitor, pretende, sem presunção, auxiliá-lo na conquista da consciência.
Não apresenta qualquer técnica nova ou milagrosa. Estuda algumas problemáticas humanas à luz da Quarta Força em Psicologia, colocando uma ponte na direção da Doutrina Espírita, que é portadora de uma visão profunda e integral do ser.
Confiamos que será útil a alguém que se encontre aflito ou fugindo de si mesmo, ajudando-o na solução do seu problema, e isto nos compensará plenamente .
Salvador, 19 de maio de 1993.
Joanna de Ângelis

(*) o Livro dos Espíritos. 29ªedição da FEB. Questão 919.