segunda-feira, 27 de outubro de 2014

O Essencial

Face ao inevitável processo de crescimento do Eu profundo, a vida assume características variadas, e as oportunidades se deparam convidativas, acenando com a libertação, que somente se consegue a penosos esforços.
Na fase inicial da predominância egocêntrica, o ser projeta-se no mundo com o qual se identifica, aprisionando-se no emaranhado das coisas exteriores, sob conflitos que não tem condições de administrar, quase sempre desequilibrando-se e passando a estados neuróticos de insatisfação, ansiedade, medo ou a alucinações variadas.
O apego, essa fixação perturbadora à impermanência, a que pretende dar perenidade, constitui-lhe a meta existencial.
Mais tarde, em tentativas de desvencilhamento da situação psicológica infantil, avança para a posição egoísta, cultivando os valores pessoais, narcisistas, com os quais se engolfa, despertando na amargura, sob os camartelos do tempo degenerador e da frustração tormentosa.
O essencial, quase sempre, permanece-lhe em plano secundário na paisagem psicológica das aspirações conflitivas.
À medida que amadurece, transfere-se das coisas e prisões egóicas para a conquista da sua realidade: o desenvolvimento do Eu profundo que deve predominar comandando os anelos e programas de libertação.
Somente a consciência de si propiciar-lhe-á a visão diferenciadora dos fenômenos perturbadores, em relação àqueloutros de plenificação.
Em tentativas brilhantes e sucessivas de penetrar os níveis, os patamares da consciência, psicólogos e estudiosos outros, das áreas das ciências psíquicas, levantam-lhe a cartografia que, variando de escola e estágio, segue os mesmos processos de desenvolvimento que são compatíveis com o crescimento do ser, conforme as suas experiências vivenciais na busca da saúde real.
Desejando ampliar o campo da análise dos seus pacientes, enquanto Freud fundamentava a Psicanálise e a difundia, Roberto Assagioli, na Itália, porque defrontava com dificuldades para aplicar, em alguns deles, as recomendações da doutrina que absorvera do mestre vienense, começou a trabalhar na organização da Psicossíntese, na qual encontrou mais amplos recursos terapêuticos para liberá-los, assim alargando os campos do entendimento das personalidades conflitivas.
Posteriormente, o bioquímico Robert De Ropp, estudando carinhosamente as reações cerebrais, entre outras experiências, e buscando produzir estados alterados de consciência, formulou as bases e os paradigmas da sua Psicologia Criativa, inspirando-se nas experiências de George Ivanovitch Gurdjieff, com os seus complexos contributos psicológicos e cosmológicos místicos.
Buscando interpretar o mestre russo, De Ropp classificou os níveis de consciência em cinco estágios: consciência de sono sem sonhos; de sono com sonho; de sono acordado; de transcendência do eu e de consciência cósmica...[1]
Para ele, o homem evolve de maneira inesperada, às vezes, de um para outro nível, especialmente nos dois primeiros estágios de adormecimento...
Mediante psicoterapia acurada e exercícios cuidadosos, logra-se o avanço pelos diversos patamares, até a etapa final, que se torna de difícil verbalização face às emoções e descobrimentos conseguidos, nesse momento de perfeita integração com o que poderíamos chamar o Logos, o pensamento divino.
No primeiro nível — quando se transita no sono sem sonhos — apenas os fenômenos orgânicos automáticos se exteriorizam, assim mesmo sem o conhecimento da consciência, tais: respiração, digestão, reprodução, circulação sanguínea...
Como se estivesse anestesiada, ela não tem ação lúcida sobre os acontecimentos em torno da própria existência, e a ausência de vontade do indivíduo contribui para o seu trânsito lento do instinto aos pródromos da razão.
No segundo nível, o sono com sonhos, ele libera clichês e lentamente incorpora-os à realidade, passando pelas fases dramáticas — os pesadelos, os pavores — para os da líbido — ação dos estímulos sexuais — e os reveladores — que dizem respeito à parcial libertação do Espírito quando o corpo está em repouso...
O desenvolvimento da consciência atinge o terceiro nível, o de sono acordado, no qual a determinação pessoal, aliada à vontade, conduz o ser aos ideais de enobrecimento, à descoberta da finalidade da sua existência, às aspirações do que lhe é essencial, ao auto encontro, à realização total.
Naturalmente, a partir daí, ascende ao quarto estado, que é a descoberta da transcendência do eu, a identificação consigo mesmo, com a consequente liberação do Eu profundo, realizando a harmonia íntima com os ideais superiores, seu real objetivo psicológico existencial.
A superação dos conflitos, das angústias, a desidentificação dos conteúdos psicológicos afugentes, permitem a iluminação, e a próxima é a meta da vinculação com a consciência cósmica.
Nem sempre, porém, o homem e a mulher conseguem alcançar esse nível ideal, fenômeno que, não obstante, será realizado através das reencarnações que lhes facultarão a vitória sobre os carmas negativos e, mediante as leis de causa e efeito, passo a passo, em esforço contínuo poderão fazê-lo.
Da mesma forma, a reencarnação aclara a cartografia da consciência de De Ropp, quando ele analisa os níveis que diferenciam os indivíduos na imensa mole humana.
As experiências acumuladas promovem ou retêm o indivíduo nos fenômenos decorrentes das ações praticadas, beneficiando-os ou afligindo-os com as sombras que lhes permanecem dominadoras, na condição de resíduos espirituais. A consciência filtra-os e, por não os poder digerir, transforma-os em conflitos, perturbações, estados psicopatológicos, requerendo terapias especializadas e contínuas.
Em qualquer nível, porém, a partir do sono com sonhos, a vontade desempenha um papel relevante, impulsionando o ser a novas realizações e conquistas completadoras que enriquecem o arsenal psicológico, amadurecendo o essencial à vida e selecionando-o do amontoado egóico do supérfluo.
Psicoterapeuta Excepcional com a Sua visão realista e criativa, Jesus definiu a necessidade de buscar-se primeiro o reino dos Céus, pois que esse fanal ensejaria a conquista de todas as outras coisas. E óbvio que, ao se adquirir o essencial, todas as coisas perdem o significado, por se encontrarem destituídas de valor face ao que somente é fundamental. Outrossim, alertou sobre o imperativo de fazer-se ao próximo o que se gostaria que este lhe fizesse, fixando no amor o processo de libertação, na ação edificante o meio de crescimento e na oração fortalecedora a energia que proporciona o desiderato.
Esse desempenho favorece a perfeita identificação do sentimento com o conhecimento, resultando na conquista do Eu profundo em sintonia com a Consciência Cósmica.




[1] (*) Vide: Rumo às estrelas — Luis C. Postiglioni — Capítulo 20 — Espíritos
diversos — Instituto de Difusão Espírita. Médiuns e Mediunidade —
Espírito Vianna de Carvalho — Capítulo 5 — Editora Arte e Cultura. - Nota
da Autora espiritual.

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