OITAVA PARTE
SILÊNCIO INTERIOR
Silêncio Interior
A grande problemática-desafio da criatura humana é a
aquisição da paz.
Empenhando-se na sua conquista, raramente busca e
segue os caminhos ideais, capazes de conduzir à sua meta.
Vivendo uma época de conturbação nas diversas áreas,
tumultua-se com facilidade, mesmo quando pensa encontrar-se no rumo certo.
Atavicamente amante do ego, apega-se aos valores
externos, e esse comportamento se torna responsável pelos seus contínuos
insucessos.
Desequipada dos instrumentos interiores que a
harmonizariam em relação ao próximo e ao Cosmo, exaspera-se com frequência e
desanima diante dos primeiros impedimentos que considera intransponíveis.
Adaptada às conquistas exteriores de fácil logro,
abandona os propósitos iniciais de encontrar a paz, deixando a postura de não
violência para unir-se aos beligerantes, embora disfarçando a agressividade. A
Terra tem vivido sempre em guerra, e as Nações apenas repousam no interregno
dos conflitos, saindo de um para outro, sem encontrar o caminho para a
preservação da tranquilidade geral.
A essas guerras violentas sucedem os armistícios — que
são pequenos períodos de repouso, nos quais os litigantes recuperam as forças para
novas lutas —sempre eclodindo focos de destruição decorrentes de motivos injustificáveis
e de razões nenhumas, como se os houvesse legítimos para a hediondez das
batalhas sangrentas.
Tal sucede, porque os indivíduos não têm paz íntima.
Desde que não são capazes de se tolerarem
reciprocamente em pequenos grupos, não se encontram em condições de respeitar
os tratados, por eles mesmos firmados, os quais apenas escondem-lhes a
brutalidade que passa a ter característica de civilização e cultura.
Como decorrência, a paz mundial ainda é uma utopia, em
razão da falta de inteireza moral e pacificadora da própria criatura.
Esse fenômeno resulta dos seus apegos egóicos, das
suas fantasias douradas, das suas paixões e da sua volúpia pela dominação dos
outros.
Apegos morais, emocionais, culturais, pessoais, a
objetos, a raças, a grupos sociais, são as fugas do ego arbitrário, ambicioso e
louco, responsável pelas disputas lamentáveis que, deterioradas, são os germes
das guerras.
Esse estado psicológico, de transferência e projeção
da sombra da personalidade imatura, é fruto da balbúrdia, dos interesses
mesquinhos e múltiplos aos quais se aferra, desajustando-se diante da ordem, da
natureza e da vida.
É indispensável uma revisão do comportamento humano,
de um estudo profundo a respeito do silêncio íntimo, assim como da harmonia
interior.
A única maneira de lográ-lo, é viajar para dentro de
si, domando a mente irrequieta — que os orientais chamam o “macaco louco que
salta de galho em galho” — e induzi-la à reflexão, ao autodescobrimento.
Há quem tema a quietude, porquanto, ao dar-se esta,
ocorre a libertação do ego e o ser se ilumina.
Todos somos escravos da mente.
O universo existe em razão daquele que o observa, da
mente que o analisa, da percepção com que o abarca.
Aquele cuja mente não dispõe de tirocínio e lucidez,
não se dá conta da realidade, que para ele tem outros conteúdos e significados.
Face a tal conduta, fala e produz ruído. É nobre e
útil quando se comunica e, no entanto, torna-se grandioso se consegue viver em
silêncio mental.
Os conteúdos psíquicos em relação ao ego, quando
captados por este, constituem a consciência lúcida, e o silêncio torna-se de
grande importância para essa conquista.
O silêncio interior é feito de paz e completude,
quando o ser compreende o significado da sua vida e a gravidade da sua conduta
em relação aos demais membros que formam o Cosmo.
A Ciência hoje une-se à Religião — trata-se de uma
perfeita identificação do ego e do eu, do Logos e de Eros — vinculando-se uma à
outra, passando a contribuir para a felicidade humana sem enfrentamentos, qual
ocorreu outrora através dos antagonismos absurdos.
Até aqui a Ciência vinha trabalhando apenas pelo
conhecimento, enquanto a Religião buscava somente religar a criatura ao
Criador, marchando separadas e em oposição.
A Psicologia Transpessoal, estudando os estados
alterados de consciência, indo além da consciência em si mesma, facultou a
união das técnicas místicas do oriente com a razão do ocidente, favorecendo o
entrosamento de Eros e Logos a benefício da individuação plena do ser.
Marcham, vinculadas, agora, fé e razão, contribuindo
para o surgimento do ser feliz. O silêncio interior constitui o grande
intermediário da paz, que dessa união advém, por desenvolver na criatura o
sentimento de amor — por Deus, por si mesmo, pelo próximo —tornando-se este
amor o produto alquímico que dilui o ódio, que vence as barreiras impeditivas
da fraternidade e inunda-a com os recursos e conteúdos psíquicos libertários.
O apego egoísta, superado, cede lugar à generosidade,
à doação, e o indivíduo, livre de algemas, em silêncio íntimo, empreende a
grande experiência de viver o self em harmonia com as Leis da Vida. Isto
porque, o nível mais elevado da consciência, pelo menos na graduação humana, é
o cósmico, que resulta da identificação entre o si e o Universo, mergulhando o pensamento em
Deus e realizando-se totalmente.
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