Cap. X
– Itens 9 a 13
O argueiro e a trave no olho
O argueiro e a trave no olho
9. Como é que vedes um argueiro no olho do vosso
irmão, quando não vedes uma trave no vosso olho? - Ou, como é que dizeis ao
vosso irmão: Deixa-me tirar um argueiro ao teu olho, vós que tendes no vosso
uma trave? - Hipócritas, tirai primeiro a trave ao vosso olho e depois, então,
vede como podereis tirar o argueiro do olho do vosso irmão. (S. MATEUS, cap.
VII, vv. 3 a 5.)
10. Uma das insensatezes da Humanidade consiste em
vermos o mal de outrem, antes de vermos o mal que está em nós. Para julgar-se a
si mesmo, fora preciso que o homem pudesse ver seu interior num espelho,
pudesse, de certo modo, transportar-se para fora de si próprio, considerar-se
como outra pessoa e perguntar: Que pensaria eu, se visse alguém fazer o que
faço? Incontestavelmente, é o orgulho que induz o homem a dissimular, para si
mesmo, os seus defeitos, tanto morais, quanto físicos. Semelhante insensatez é
essencialmente contrária à caridade, porquanto a verdadeira caridade é modesta,
simples e indulgente. Caridade orgulhosa é um contrassenso, visto que esses
dois sentimentos se neutralizam um ao outro. Com efeito, como poderá um homem,
bastante presunçoso para acreditar na importância da sua personalidade e na
supremacia das suas qualidades, possuir ao mesmo tempo abnegação bastante para
fazer ressaltar em outrem o bem que o eclipsaria, em vez do mal que o
exalçaria? Por isso mesmo, porque é o pai de muitos vícios, o orgulho é também
a negação de muitas virtudes. Ele se encontra na base e como móvel de quase
todas as ações humanas. Essa a razão por que Jesus se empenhou tanto em
combatê-lo, como principal obstáculo ao progresso.
11. Não
julgueis, a fim de não serdes julgados; - porquanto sereis julgados conforme
houverdes julgado os outros; empregar-se-á convosco a mesma medida de que voz
tenhais servido para com os outros. (S. MATEUS, cap. VII, vv. 1 e 2.)
12. Então, os escribas e os fariseus lhe
trouxeram uma mulher que fora surpreendida em adultério e, pondo-a de pé no
meio do povo, - disseram a Jesus: "Mestre,
esta mulher acaba de ser surpreendida em adultério; - Ora, Moisés, pela lei,
ordena que se lapidem as adúlteras. Qual sobre isso a tua opinião?" -
Diziam isto para o tentarem e terem de que o acusar. Jesus, porém,
abaixando-se, entrou a escrever na terra com o dedo. - Como continuassem a
interrogá-lo, ele se levantou e disse: "Aquele dentre vós que estiver sem pecado, atire a primeira pedra." -
Em seguida, abaixando-se de novo, continuou a escrever no chão. - Quanto aos
que o interrogavam, esses, ouvindo-o falar daquele modo, se retiraram, um após
outro, afastando-se primeiro os velhos. Ficou, pois, Jesus a sós com a mulher,
colocada no meio da praça.
Então, levantando-se, perguntou-lhe Jesus: "Mulher, onde estão os que te acusaram?
Ninguém te condenou?" - Ela respondeu: "Não, Senhor."
Disse-lhe Jesus: "Também eu não te condenarei. Vai-te e de futuro não
tornes a pecar." (S. JOÃO, cap. VIII, vv. 3 a 11.)
13. "Atire-lhe
a primeira pedra aquele que estiver isento de pecado", disse Jesus.
Essa sentença faz da indulgência um dever para nós outros, porque ninguém há
que não necessite, para si próprio, de indulgência. Ela nos ensina que não
devemos julgar com mais severidade os outros, do que nos julgamos a nós mesmos,
nem condenar em outrem aquilo de que nos absolvemos. Antes de profligarmos a
alguém uma falta, vejamos se a mesma censura não nos pode ser feita.
O reproche lançado à conduta de outrem pode obedecer a
dois móveis: reprimir o mal, ou desacreditar a pessoa cujos atos se criticam.
Não tem escusa nunca este último propósito, porquanto, no caso, então, só há
maledicência e maldade. O primeiro pode ser louvável e constitui mesmo, em
certas ocasiões, um dever, porque um bem deverá daí resultar, e porque, a não
ser assim, jamais, na sociedade, se reprimiria o mal. Não cumpre, aliás, ao
homem auxiliar o progresso do seu semelhante? Importa, pois, não se tome em
sentido absoluto este princípio: "Não julgueis se não quiserdes ser
julgado", porquanto a letra mata e o espírito vivifica.
Não é possível que Jesus haja proibido se profligue o
mal, uma vez que ele próprio nos deu o exemplo, tendo-o feito, até, em termos
enérgicos. O que quis significar é que a autoridade para censurar está na razão
direta da autoridade moral daquele que censura. Tornar-se alguém culpado
daquilo que condena noutrem é abdicar dessa autoridade, é privar-se do direito
de repressão. A consciência íntima, ao demais, nega respeito e submissão
voluntária àquele que, investido de um poder qualquer, viola as leis e os
princípios de cuja aplicação lhe cabe o encargo. Aos olhos de Deus, uma
única autoridade legítima existe: a que se apoia no exemplo que dá do
bem. E o que, igualmente, ressalta das palavras de Jesus.
Questões
para estudo:
1 – O texto mostra um modo de como identificar se o
que estamos fazendo é bom ou não. Identifique-o.
2 – Por que a indulgência é um dever para nós?
3 – Extraia do texto acima a frase ou parágrafo
que mais gostou e justifique.
Nenhum comentário:
Postar um comentário