Capítulo XIV – Itens 5 a 8
Piedade filial
Piedade filial
Quem é minha
mãe e quem são meus irmãos?
5. E, tendo vindo para casa, reuniu-se aí tão
grande multidão de gente, que eles nem sequer podiam fazer sua refeição. -
Sabendo disso, vieram seus parentes para se apoderarem dele, pois diziam que perdera o espírito.
Entretanto, tendo vindo sua mãe e seus irmãos e
conservando-se do lodo de fora, mandaram chamá-lo. - Ora, o povo se assentara
em torno dele e lhe disseram: Tua mãe e teus irmãos estão lá fora e te chamam.
- Ele lhes respondeu: Quem é
minha mãe e quem são meus irmãos? E, perpassando o olhar pelos que
estavam assentados ao seu derredor, disse: Eis aqui minha mãe e meus irmãos; -
pois, todo aquele que faz a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e
minha mãe. (S.
MARCOS. cap. III, vv. 20, 21 e 31 a 35 - S. MATEUS, cap. XII, vv. 46 a 50.)
6. Singulares
parecem algumas palavras de Jesus, por contrastarem com a sua bondade e a sua
inalterável benevolência para com todos. Os incrédulos não deixaram de tirar
daí uma arma, pretendendo que ele se contradizia. Fato, porém, irrecusável é
que sua doutrina tem por base principal, por pedra angular, a lei de amor e de
caridade. Ora, não é possível que ele destruísse de um lado o que do outro
estabelecia, donde esta consequência rigorosa: se certas proposições suas se acham
em contradição com aquele princípio básico, é que as palavras que se lhe
atribuem foram ou mal reproduzidas, ou mal compreendidas, ou não são suas.
7. Causa
admiração, e com fundamento, que, neste passo, mostrasse Jesus tanta
indiferença para com seus parentes e, de certo modo, renegasse sua mãe.
Pelo que
concerne a seus irmãos, sabe-se que não o estimavam. Espíritos pouco
adiantados, não lhe compreendiam a missão: tinham por excêntrico o seu proceder
e seus ensinamentos não os tocavam, tanto que nenhum deles o seguiu como
discípulo. Dir-se-ia mesmo que partilhavam, até certo ponto, das prevenções de
seus inimigos. O que é fato, em suma, é que o acolhiam mais como um estranho do
que como um irmão, quando aparecia à família. S. João diz, positivamente (cap.
VII, v. 5), "que eles não lhe davam crédito".
Quanto à sua
mãe, ninguém ousaria contestar a ternura que lhe dedicava. Deve-se, entretanto,
convir igualmente em que também ela não fazia ideia muito exata da missão do
filho, pois não se vê que lhe tenha nunca seguido os ensinos, nem dado
testemunho dele, como fez João Batista. O que nela predominava era a solicitude
maternal. Supor que ele haja renegado sua mãe fora desconhecer-lhe o caráter.
Semelhante ideia não poderia encontrar guarida naquele que disse: Honrai
a vosso pai e a vossa mãe. Necessário, pois, se faz procurar outro
sentido para suas palavras, quase sempre envoltas no véu da forma alegórica.
Ele nenhuma
ocasião desprezava de dar um ensino; aproveitou, portanto, a que se lhe
deparou, com a chegada de sua família, para precisar a diferença que existe
entre a parentela corporal e a parentela espiritual.
8. Os laços do
sangue não criam forçosamente os liames entre os Espíritos. O corpo procede do
corpo, mas o Espírito não procede do Espírito, porquanto o Espírito já existia
antes da formação do corpo. Não é o pai quem cria o Espírito de seu filho; ele
mais não faz do que lhe fornecer o invólucro corpóreo, cumprindo-lhe, no
entanto, auxiliar o desenvolvimento intelectual e moral do filho, para fazê-lo
progredir.
Os que
encarnam numa família, sobretudo como parentes próximos, são, as mais das
vezes, Espíritos simpáticos, ligados por anteriores relações, que se expressam
por uma afeição recíproca na vida terrena. Mas, também pode acontecer sejam
completamente estranhos uns aos outros esses Espíritos, afastados entre si por
antipatias igualmente anteriores, que se traduzem na Terra por um mútuo
antagonismo, que aí lhes serve de provação. Não são os da consanguinidade os
verdadeiros laços de família e sim os da simpatia e da comunhão de ideias, os
quais prendem os Espíritos antes, durante e depois de suas
encarnações. Segue-se que dois seres nascidos de pais diferentes podem ser mais
irmãos pelo Espírito, do que se o fossem pelo sangue. Podem então atrair-se,
buscar-se, sentir prazer quando juntos, ao passo que dois irmãos consanguíneos
podem repelir-se, conforme se observa todos os dias: problema moral que só o
Espiritismo podia resolver pela pluralidade das existências. (Cap. IV, nº 13.)
Há, pois, duas
espécies de famílias: as famílias pelos laços espirituais e as famílias
pelos laços corporais. Duráveis, as primeiras se fortalecem pela
purificação e se perpetuam no mundo dos Espíritos, através das várias migrações
da alma; as segundas, frágeis como a matéria, se extinguem com o tempo e muitas
vezes se dissolvem moralmente, já na existência atual. Foi o que Jesus quis
tornar compreensível, dizendo de seus discípulos: Aqui estão minha mãe e meus
irmãos, isto é, minha família pelos laços do Espírito, pois todo aquele que faz
a vontade de meu Pai que está nos céus é meu irmão, minha irmã e minha mãe.
A hostilidade
que lhe moviam seus irmãos se acha claramente expressa em a narração de São
Marcos, que diz terem eles o propósito de se apoderarem do Mestre, sob o
pretexto de que este perdera o espirito. Informado da chegada
deles, conhecendo os sentimentos que nutriam a seu respeito, era natural que
Jesus dissesse, referindo-se a seus discípulos, do ponto de vista espiritual:
"Eis aqui meus verdadeiros irmãos." Embora na companhia daqueles
estivesse sua mãe, ele generaliza o ensino que de maneira alguma implica haja
pretendido declarar que sua mãe segundo o corpo nada lhe era como Espírito, que
só indiferença lhe merecia. Provou suficientemente o contrário em várias outras
circunstâncias.
Questões para
estudo
1 - Como se explica o vínculo que existe entre um pai
e um filho?
2 - Como se formam as famílias aqui na Terra?
3 - Como definimos a parentela corporal e espiritual?
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