Cap. IV – Itens 1 a 7
1. Jesus, tendo vindo às cercanias de Cezareia
de Filipe, interrogou assim seus discípulos: "Que dizem os homens, com
relação ao Filho do Homem? Quem dizem que eu sou?" - Eles lhe responderam:
"Dizem uns que és João Batista; outros, que Elias; outros, que Jeremias,
ou algum dos profetas." - Perguntou-lhes Jesus: "E vós, quem dizeis
que eu sou?" - Simão Pedro, tomando a palavra, respondeu: "Tu és o
Cristo, o Filho do Deus vivo." - Replicou-lhe Jesus: "Bem-aventurado
és, Simão, filho de Jonas, porque não foram a carne nem o sangue que isso te
revelaram, mas meu Pai, que está nos céus." (S. Mateus, cap. XVI, vv.
13 a 17; S. Marcos, cap. VIII, vv. 27 a 30.)
2. Nesse ínterim, Herodes, o Tetrarca, ouvira
falar de tudo o que fazia Jesus e seu espírito se achava em suspenso - porque
uns diziam que João Batista ressuscitara dentre os mortos; outros que aparecera
Elias; e outros que uns dos antigos profetas ressuscitara. - Disse então
Herodes: "Mandei cortar a cabeça a João Batista; quem é então esse de quem
ouço dizer tão grandes coisas?" E ardia por vê-lo. (S. Marcos, cap.
VI, vv. 14 a 16; S. Lucas, cap. IX, vv. 7 a 9.)
3. (Após a
transfiguração.) Seus discípulos então o
interrogam desta forma: "Por que dizem os escribas ser preciso que antes
volte Elias?" - Jesus lhes respondeu: "É verdade que Elias há de vir
e restabelecer todas as coisas: - mas, eu vos declaro que Elias já veio e eles
não o conheceram e o trataram como lhes aprouve. É assim que farão sofrer o
Filho do Homem." - Então, seus discípulos compreenderam que fora de João
Batista que ele falara. (S. Mateus, cap. XVII, vv. 10 a 13; - S. Marcos,
cap. IX, vv. 11 a 13.)
4. A
reencarnação fazia parte dos dogmas dos judeus, sob o nome de ressurreição. Só os saduceus, cuja crença era a de
que tudo acaba com a morte, não acreditavam nisso. As ideias dos judeus sobre
esse ponto, como sobre muitos outros, não eram claramente definidas, porque
apenas tinham vagas e incompletas noções acerca da alma e da sua ligação com o
corpo. Criam eles que um homem que vivera podia reviver, sem saberem
precisamente de que maneira o fato poderia dar-se. Designavam pelo termo ressurreição o que o Espiritismo, mais
judiciosamente, chama reencarnação. Com efeito, a ressurreição dá ideia de voltar à vida o corpo que
já está morto, o que a Ciência demonstra ser materialmente impossível,
sobretudo quando os elementos desse corpo já se acham desde muito tempo
dispersos e absorvidos. A reencarnação é a volta da alma ou Espírito à vida
corpórea, mas em outro corpo especialmente formado para ele e que nada tem de
comum com o antigo. A palavra ressurreição podia assim aplicar-se a Lázaro, mas
não a Elias, nem aos outros profetas. Se, portanto, segundo a crença deles,
João Batista era Elias, o corpo de João não podia ser o de Elias, pois que João
fora visto criança e seus pais eram conhecidos. João, pois, podia ser Elias reencarnado, porém, não ressuscitado.
5. Ora, entre os fariseus, havia um homem
chamado Nicodememos, senador dos judeus - que veio à noite ter com Jesus e lhe
disse: "Mestre, sabemos que vieste da parte de Deus para nos instruir como
um doutor, porquanto ninguém poderia fazer os milagres que fazes, se Deus não
estivesse com ele."
Jesus lhe
respondeu: "Em verdade, em verdade, digo-te: Ninguém pode ver o reino de Deus se
não nascer de novo."
Disse-lhe
Nicodemos: "Como pode nascer um homem já velho? Pode tornar a entrar no
ventre de sua mãe, para nascer segunda vez?"
Retorquiu-lhe
Jesus: "Em verdade, em verdade, digo-te: Se um homem não renasce da água e
do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. - O que é nascido da carne e o
que é nascido do Espírito é Espírito. - Não te admires de que eu te haja dito
ser preciso que nasças de novo. - O Espírito sopra onde quer e ouves a sua voz,
mas não sabes donde vem ele, nem para onde vai; o mesmo se dá com todo homem
que é nascido do Espírito."
Respondeu-lhe
Nicodemos: "Como pode isso fazer-se?" - Jesus lhe observou:
"Pois quê! és mestre em Israel e ignoras estas coisas? Digo-te em verdade,
em verdade, que não dizemos senão o que sabemos e que não damos testemunho,
senão do que temos visto. Entretanto, não aceitas o nosso testemunho. - Mas, se
não me credes, quando vos falo das coisas da Terra, como me crereis, quando vos
fale das coisas do céu?" (S. JOÃO, cap. III, vv. 1 a 12.)
6. A ideia de
que João Batista era Elias e de que os profetas podiam reviver na Terra se nos
depara em muitas passagens dos Evangelhos, notadamente nas acima reproduzidas
(nº 1, nº 2, nº 3). Se fosse errônea essa crença, Jesus não houvera deixado de
a combater, como combateu tantas outras. Longe disso, ele a sanciona com toda a
sua autoridade e a põe por princípio e como condição necessária, quando diz:
"Ninguém pode ver o reino de Deus se não nascer de novo." E insiste,
acrescentando: Não te admires de
que eu te haja dito ser preciso nasças de novo.
7. Estas palavras: Se um homem não renasce da água e do
Espírito foram interpretadas no sentido
da regeneração pela água do batismo. O texto primitivo, porém, rezava
simplesmente: não renasce da água
e do Espírito, ao passo que
nalgumas traduções as palavras -
do Espírito - foram substituídas
pelas seguintes: do Santo
Espírito, o que já não
corresponde ao mesmo pensamento. Esse ponto capital ressalta dos primeiros
comentários a que os Evangelhos deram lugar, como se comprovará um dia, sem
equívoco possível. (1)
(1) A tradução
de Osterwald está conforme o texto primitivo. Diz: "Não renasce da água e
do Espírito"; a de Sacy diz: do Santo Espírito; a de Lamennais: do
Espírito Santo.
À nota de
Allan Kardec, podemos hoje acrescentar que as modernas traduções já restituíram
o texto primitivo, pois que só imprimem "Espírito" e não Espírito
Santo. Examinamos a tradução brasileira, a inglesa, a em esperanto, a de
Ferreira de Almeida, e todas elas está somente "Espírito".
Além dessas
modernas, encontramos a confirmação numa latina de Theodoro de Beza, de 1642,
que diz:
"...genitus
ex aqua et Spiritu..." "...et quod genitum est ex Spiritu, spiritus
est."
É fora de
dúvida que a palavra "Santo" foi interpolada, como diz Kardec. - A
Editora da FEB, 1947.
Questões para estudo e diálogo virtual:
1 – Como era a
crença dos judeus com relação à reencarnação?
2 – Como
interpretar “Se um homem não renasce da água e do Espírito, não pode entrar no
reino de Deus”?
3 – Extraia do
texto acima a frase ou parágrafo que mais gostou e justifique.
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