TERCEIRA PARTE
PROBLEMAS E DESAFIOS
Êxito e fracasso
O estado normal da
criatura é o de saúde, no qual o bem-estar e o equilíbrio proporcionam clima
respirável de satisfação.
Elaborada para um
ritmo harmônico de vida, a maquinaria fisiopsiquica obedece a automatismos
precisos, dos quais resultam a saúde e as disposições emocionais, para
galgar-se patamares reais elevados nos processos das aspirações idealistas.
Ser pensante,
destaca-se a criatura na escala zoológica, compreendendo os mecanismos da vida
e aplicando o conhecimento para os logros da auto realização e da autoplenificação
que lhe constituem o ápice da saúde.
Saúde seria,
portanto, um fenômeno natural. Não fossem, do ponto de vista biopsicológico, as
heranças genéticas, os fatores psicossociais, as ocorrências familiares e o
convívio do lar, o ser não atravessaria os caminhos difíceis dos distúrbios e
doenças perturbadoras.
Considerado o ser
apenas como uma máquina, teríamos a vida sem finalidade nem objetivo, porquanto
ele já nasceria sob os estigmas dos ancestrais — no que diz respeito às
heranças genéticas, ao lar condicionador e à sociedade — no caso das distonias
e anormalidades, das síndromes degenerativas e dos fenômenos patológicos
vários, que determinam as desgraças de uns, e, por outro lado, os
propiciatórios para a felicidade, a saúde e a beleza de reduzida faixa dos
demais.
Sem dúvida, tal
colocação falha pela ausência de uma sustentação lógica, considerando todas as
ocorrências como procedentes do acaso fatalista e absurdo...
A análise
transpessoal do ser concede-lhe dignidade causal e destinação final, mediante a
travessia do percurso que lhe cumpre trilhar, gerando os meios felicitadores,
ou desditosos, que são efeitos das suas realizações precedentes.
Passo a passo,
desenvolvem-se os atributos da personalidade, ampliando-se os conteúdos da
individualidade e aprimoram-se as aptidões latentes que são o germe da presença
divina em todos.
Possuidor de
recursos e potências não dimensionadas, o ser desabrocha e cresce sob as
condições que lhe são inerentes, cabendo-lhe seguir o heliotropismo superior
que o leva à sua destinação gloriosa.
Impregnado pelas
partículas e moléculas materiais que o vestem, enquanto reencarnado, não raro a
visão do êxito apresenta-se-lhe distorcida, caracterizando-se como o deleite
contínuo, resultante dos prazeres hedonistas que a posição social relevante e o
poder político-econômico proporcionam, ensejando um prolongado desfrutar.
Esquecendo-se da
impermanência de tudo e da fugacidade do tempo — pelo qual apenas transita, na
sua dimensão de eternidade — desgasta-se, envelhece, adoece e morre... O
imprevisível surpreende-o, e surgem-lhe a saturação, o desinteresse, os
sentimentos apaixonados e os frustrados, proporcionando desequilíbrios
interiores que se expressarão em tormentos para si e para os outros no
inter-relacionamento pessoal.
Na busca do êxito, o
ser, psicologicamente imaturo, investe todos os valores, e na competição
encontra o estímulo para galgar os degraus do destaque, descendo moralmente, na
escala dos padrões, à medida que ascende na aparência.
Essa dicotomia de
ocorrências — a interna e a externa — resultará em infelicitá-lo,
perturbando-lhe o senso de avaliação e de consideração da realidade, talvez
ferindo profundamente a pessoa.
Caça-se o êxito como
se fosse, na floresta humana, o objetivo essencial à vida, confundindo-se
triunfo de fora com realização de harmonia interior.
Denigre-se então o
adversário, que não o sabe, tornado assim por estar à frente ou mais alto;
segue-se-lhe o passo, ocupando-lhe o lugar imediatamente inferior por ele
deixado, até emparelhar-se-lhe e derrubá-lo, assumindo-lhe a posição.
Inevitavelmente,
porque não permanecem espaços vazios nos relacionamentos humanos, enquanto, por
sua vez ascende, deixa o degrau aberto que logo estará ocupado por aqueloutro
que lhe será o substituto.
O triunfo de hoje é
o prólogo do desencanto e das lágrimas de amanhã; sorrisos se tornarão esgares,
e aplausos far-se-ão apedrejamentos, considerando-se, na população humana, as
mesmas aspirações e os equivalentes conflitos.
A criatura são as
suas necessidades.
O psicólogo
americano pragmatista, William James, classificou os biótipos humanos em
espíritos fracos e fortes, enquanto Ernesto Kretschmer, psiquiatra alemão,
considerou as personalidades de acordo com a compleição do indivíduo em
pícnico, ou pessoa redonda; atlético, ou pessoa quadrada; e o astênico, pessoa
delgada. Face a tal conclusão, afirmou que há espíritos esquizóides e
ciclotímicos, enquanto Carlos Gustavo Jung os considerou introvertidos e
extrovertidos.
Em todos há uma
ânsia comum: os fracos fortalecerem-se, os ciclotímicos harmonizarem-se e os
introvertidos exteriorizarem-se.
As psicoterapias são
aplicadas conforme as revelações do inconsciente, arrancando dos arquivos do psiquismo
os fatores que geraram os traumas e determinaram os conflitos, interpretando as
ocorrências dos sonhos nos estados oníricos e as liberações catársicas nas
demoradas análises.
Nem sempre, porém,
serão encontradas as matrizes de tais patologias, que estão profundamente
registradas no Espírito, como decorrência de condutas, de atividades, dos
sucessos das reencarnações passadas.
Somente a sondagem
cuidadosa dos arcanos do ser pretérito enseja o encontro das causas passadas,
geradoras dos problemas atuais.
Uma análise
transpessoal libera-o dos tabus, inclusive, da visão distorcida da realidade,
que deixa de ser a exclusiva expressão terrena, para transportá-la para a vida
imortal, precedente ao corpo e a ele sobrevivente, demonstrando que o êxito, o
triunfo, o fracasso, o insucesso, não se apresentam conforme a proposta social
imediatista, porém outra mais significativa e poderosa.
Convém determinar-se
que o êxito material pode significar fracasso emocional, espiritual, e, às
vezes, o insucesso, a aparente falta de triunfo constitui a plena vitória sobre
si mesmo, suas paixões e pequenezes, uma forma de opção para o crescimento
interior, ao invés do empenho pelo amealhar de moedas e reunião de títulos que
não acalmam as emoções nem tranquilizam as ambições.
Certamente, a
criatura deve possuir e dispor de recursos necessários para uma vida saudável,
consentânea com o grupo social no qual se encontra. No entanto, o êxito não
pode ser medido em contas bancárias, prestígio na comunidade e destaque
político. Da mesma forma, não é factível definir-se por fracasso a ausência
desses troféus.
Os homens e mulheres
plenos, vitoriosos de todos os tempos, venceram-se, completaram-se e, sem
qualquer tipo de conflito, optaram pela realização interior, respeitando todas
as aspirações e direitos dos demais indivíduos, porém, a eles próprios
impondo-se a auto realização que lhes propiciou saúde — mesmo quando enfermos
—, felicidade — embora perseguidos algumas vezes — e êxito — isto é, a vitória
no que anelavam, apesar de levados ao martírio.
A visão transpessoal
do êxito e do fracasso está ínsita na pessoa interior, real, a criatura
harmonizada consigo mesma, com as outras pessoas, com a natureza e a vida.
Êxito é encontro,
enquanto fracasso é domínio pelo ego.
O êxito gera paz, e
o fracasso inquieta.
Autoanalisando-se,
cada qual se descobre, assim dando-se conta do triunfo ou do insucesso, podendo
recomeçar para alcançar o êxito, nunca o fracasso.
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